Cara leitora ou prezado leitor:
Esta é a nona crônica da série “D. Izaura e sua
gente”. Prossigo com as histórias.
A família fazia reuniões e festas animadas no
sobrado de D. Izaura.
As reuniões eram almoços e jantares da família – filhos e cônjuges de D. Izaura mais alguns convidados – em comemorações de aniversários e de datas como o Natal, por exemplo. Eu era convidado.
Não me
lembro como começou, mas eu era estimulado a fazer algum discurso ou saudação,
e era aplaudido. Em um dos almoços, fiz um discurso destacando a convivência e
a reunião da família naquela data. Fui aplaudido, mas um deles me chamou de
lado e disse: “Washington, gostamos muito de seu discurso, mas a data que estamos comemorando
é o Natal e não o Carnaval” – eu tinha trocado as palavras! De qualquer forma,
é desse tempo que criei o hábito de discursar nas reuniões de família, o que
faço até depois de velho.
De vez em quando, no sobrado, faziam uma festa
dançante. O motivo devia ser uma comemoração maior de algum aniversário. Eram
festas realizadas no fim de semana, no final da tarde, tipo coquetel (naquele
tempo era “cocktail”). Caprichadas, com bebidas, salgadinhos e dança. Abria-se o
salão, devidamente preparado e engalanado. A música era proporcionada por uma
vitrola (toca-discos) com músicas selecionadas.
Participavam todos da família que estivessem em
São Paulo, mais outros parentes e amigos. Por exemplo, primos do lado de D. Izaura,
algum dos irmãos de Narciso (marido de D. Helena) e de Seu Chico (marido de D. Cida), amigos do pessoal da casa; além de
mim, lembro-me de uma festa em que convidaram meus pais.
Os comes e bebes eram generosos, com bebidas finas
(destilados, vinhos e cerveja). Lembro-me que, já em meus 18 anos, lá me foi
apresentado o whisky escocês (“Cavalo Branco” era o mais famoso), tomado com
guaraná; não gostei muito da mistura, preferi continuar com vermute, um bom
vinho espanhol ou mesmo com cerveja (de preferência a Munchen Extra, da
Antártica).
No baile, as músicas eram variadas: tocavam boleros, “foxes”, sambas, marchinhas, até valsas. Destacavam-se alguns pares, que dançavam bem; em particular, o Gentil e a Fernanda com seu show de tango. Estes eram muito aplaudidos. A festa era animada com algumas sessões em que eram formados pares com o que chamavam “cotillon”. Essa formação era feita mediante combinação por sorteio de nomes de amantes famosos da história e da ficção. Preparavam papeizinhos dobrados com nomes de homens como Romeu, Sansão, Adão, Hamlet, Tristão etc. e colocavam em um chapéu; em outro, papéis com as amadas correspondentes: Julieta, Dalila, Eva, Ofélia, Isolda etc. Os convidados e convidadas pegavam os papéis nos chapéus correspondentes e depois procuravam os respectivos pares para a sessão especial de dança. Era divertido, porque os pares eram os mais variados. Os garotões, Sérgio e eu, participávamos. Comigo, houve uma coincidência curiosa: aconteceu, pelo menos duas vezes, ser sorteada como meu par a Antonieta, irmã mais nova do Seu Chico, moça bonita e simpática nos seus vinte e poucos anos, que comparecia às festas com o noivo, o Geraldo Hering, também jovem e bonitão. Eu ficava um pouco constrangido porque achava que ele podia não gostar de ver a noiva dançando com um garoto, mas eu não tinha jeito de mudar a regra do jogo.
As festas eram animadas e, pelo que me lembro, os
participantes eram bem-comportados. Tenho na lembrança, apenas, um incidente
curioso: a uma das festas compareceu um casal amigo – ele era brasileiro e ela,
estrangeira (russa, segundo falaram). Esta, na animação da festa, se encantou
com o Seu Chico – um dos mais sérios e tranquilos da turma – que ficou muito
admirado. D. Cida tomou suas providências e não houve consequência.
Lúcio, marido de D. Glória, como bom descendente
de italianos do sul, animava algumas das reuniões da família cantando músicas
napolitanas. Conhecia bem as letras; não era um Pavarotti, mas era afinado; e
fazia sucesso com “Torna a Surriento”, “O Sole Mio”, e outras canções.
As reuniões e festas do sobrado me proporcionaram
a oportunidade de conhecer mais pessoas
da família de D. Izaura e da família do Narciso, os Braz.
Quanto à Antonieta e ao Hering, casaram-se em 1950,
com festa na casa de Seu Chico e D. Cida, no bairro do Pacaembu.
Anos depois, Leilah e eu, já casados, mantivemos longa amizade com o casal e seus filhos.
Washington Luiz Bastos Conceição
Notas:
A. A foto de Antonieta e Hering foi cedida pela prima Cristina, filha do casal.
B. Cara leitora ou prezado leitor: para ler quaisquer das oito primeiras crônicas da série, clique nos respectivos links abaixo:
1) D. Izaura e sua gente – Introdução
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/02/d-izaura-e-sua-gente-introducao.html
2) D. Izaura e sua gente – A casa e os moradores
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/03/d-izaura-e-sua-gente-casa-e-os-moradores.html
3) D. Izaura e sua gente – Leilah na Galvão Bueno
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/04/d-izaura-e-sua-gente-leilah-na-galvao.html
4) D. Izaura e sua gente – Vovô Juca
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/05/d-izaura-e-sua-gente-vovo-juca.html
5)
D. Izaura e sua gente – Apresentando as pessoas – 1
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/06/d-izaura-e-sua-gente-as-pessoas-1.html
6) D. Izaura e sua gente – Apresentando as pessoas
– 2
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/07/d-izaura-e-sua-gente-apresentando-as.html
7) D. Izaura e sua gente – O baile do Odeon
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/07/d-izaura-e-sua-gente-o-baile-do-odeon.html
8)
D. Izaura e sua gente – Lembranças do Gentil
https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/08/d-izaura-e-sua-gente-lembrancas-do.html
***
Como eram gostosas essas reuniões em família!!! Com comes (preparados em casa) e bebes, música e dança. Hoje quase não temos mais isso. Os apartamentos se apequenaram, as "cozinheiras" desaprenderam e os pares passaram a dançar sozinhos.. Que pena!
ResponderExcluirValeu pai! Como sempre, descrição impecável! Agora entendo o seu carinho especial pela tia Antonieta.
ResponderExcluir