sábado, 14 de setembro de 2013

Os Milagres da Televisão


Raul Tabajara, locutor esportivo que militou muitos anos em São Paulo, narrava jogos pela televisão, nas décadas de 1950 e 1960, uma época em que os canais abertos transmitiam jogos locais ao vivo. Seu companheiro habitual era o repórter de campo Sílvio Luiz. A imagem ainda era em branco e preto, os jogos dominicais eram à tarde e os estádios lotavam nos jogos mais importantes. Como não havia, durante o jogo propriamente dito, propaganda nem comentários, o locutor tinha de fazer algumas observações nas pequenas interrupções, como bolas fora e contusões dos jogadores. Nessas observações, Tabajara se repetia, fazendo observações sobre o calor da tarde, por exemplo. Ele costumava se referir, com frequência, ao milagre da televisão, ou seja, à transmissão dos jogos, que proporcionava aos telespectadores de toda a cidade assistirem às partidas confortavelmente instalados na poltrona de casa – ou da casa do vizinho.
Toda vez que penso nos “milagres da televisão”, lembro-me da expressão do Tabajara, pois os “milagres” se multiplicaram com o tempo.


Nestes dias, assisto a programas dos vários canais locais, principalmente noticiário, filmes e transmissões esportivas nacionais e internacionais; estas, habitualmente, de jogos de futebol na Europa e jogos de tênis dos grandes torneios, como o "US Open", por exemplo, realizado em Nova York. Percorro também os canais das emissoras estrangeiras, detendo-me para ouvir um pouco de notícias em Português de Portugal, o idioma falado mais parecido com o nosso, e para, eventualmente, na TV francesa, assistir a um filme francês com legenda. Outro dia, num lance de muita sorte, assistimos a um espetáculo especial de ópera na RAI, a televisão italiana, em comemoração aos duzentos anos de nascimento de Verdi.

Embora eu não tenha o hábito de acompanhar novelas, aprecio a qualidade de nossa dramaturgia de televisão, reconhecida internacionalmente.

Além de toda essa oferta de programas, posso ir e voltar de um canal a outro, aproveitando intervalos na programação, mediante uso dos botões do aparelho de controle remoto.

Estou, portanto, me valendo da extraordinária evolução da televisão num período de cerca de cinquenta anos. Da recepção da emissora local, evoluímos para a de outras cidades, mediante o uso de torres de comunicação. Hoje, temos transmissões via satélite. E mais, com o advento da televisão a cabo, ficou disponível uma grande quantidade e variedade de canais. Mais recentemente, as facilidades de gravação de programas e de aluguel de filmes diretamente da rede ampliaram nosso cardápio para a escolha do entretenimento.

Ivete Sangalo no Rock in Rio 2013,
na minha televisão
Além do aperfeiçoamento dos sistemas de transmissão, os aparelhos receptores passaram a usar tecnologia cada vez mais avançada e nos brindam com imagens excelentes.

Plateia no Rock in Rio 2013

Quanto à apresentação de programas e anúncios, que era feita ao vivo, passamos a usar a gravação em “vídeo tape”. Hoje, é difícil imaginarmos apresentações de novelas ou de comerciais ao vivo, sujeitas a todo tipo de erros e imperfeições.
Nas transmissões de jogos de futebol, em particular, comparo o que a televisão pôde apresentar nas copas do mundo, ao longo dos anos. Durante a de 1958, na Suécia, torcíamos e sofríamos ouvindo a transmissão pelo rádio, cheia de estática das ondas curtas e, somente dois dias depois de cada jogo, podíamos assistir pela televisão ao filme (de celuloide), com imagens muito pobres, em branco e preto. Durante a copa de 1962, realizada no Chile, já pudemos assistir ao "vídeo tape" no dia seguinte, por um grande “esforço de reportagem” das equipes das emissoras, que enviavam as fitas por avião. Nessas duas copas e na de 1966, os torcedores sofreram e vibraram em torno dos aparelhos de rádio.
Na copa do México, em 1970, na qual a seleção brasileira se tornou tricampeã, já pudemos assistir aos jogos ao vivo.
Toda essa evolução tecnológica permite que os programas de nossas emissoras alcancem o país inteiro, nosso imenso Brasil, penetrando cidades de todos os tamanhos e nos mais remotos rincões. Por exemplo, tive a experiência de assistir a um jogo de futebol transmitido por uma das redes, em um aparelho de cristal líquido de um barzinho da zona rural, próximo a Goianá, pequena cidade mineira na região de Juiz de Fora. Foi uma constatação pessoal de que, em todas as regiões do País, as pessoas, por mais modestas que sejam, têm a oportunidade de assistir aos mesmos programas a que assisto em casa, com boa qualidade de imagem e som.

Refletindo sobre esse alcance da transmissão de nossas emissoras, fica fácil entender o grande interesse dos políticos pelo tempo grátis de que os partidos dispõem na propaganda eleitoral, tempo esse que é moeda nos acordos entre eles. Portanto, o papel da televisão ganha, cada vez mais, importância na informação ao público e na formação de opinião. O que nos leva à conclusão de que as emissoras têm agora um enorme desafio, o de manterem sua independência e imparcialidade. Vencer este desafio deverá ser o maior milagre da televisão.

Washington Luiz Bastos Conceição