sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Comandante Castro Lima – amigo de toda a vida

Nesta vida de idosos, cheia de restrições, Leilah, minha esposa, e eu ainda pudemos viajar para São Paulo, em 2013. Fomos visitar parentes-amigos e amigos-não-parentes.

Uma das atividades da visita foi um almoço memorável em um daqueles ótimos restaurantes italianos da capital paulista. Os participantes eram de São Paulo, capital, minha sobrinha de Franca e os cariocas que foram conosco à Pauliceia. Éramos cerca de 20 pessoas.

Entre os participantes estavam Luiz Antônio Castro Lima e sua esposa Kilza.

Como de hábito, na situação de visitante prestigiado pelos amigos, fiz um breve discurso. Começando com uma situação levemente embaraçosa (ao me levantar houve um deslizamento da calça que mostrou rapidamente um pouco da roupa de baixo que eu usava para me preservar do frio hibernal paulistano, o que animou o ambiente), agradeci a presença dos amigos, mencionando os dois argentinos presentes e comentando que o outro argentino que visitava o Brasil não pôde estar conosco por causa de seus muitos compromissos (era o Papa Francisco). E destaquei que, de todos que ali estavam, o Luiz Antônio era a pessoa que eu conhecia havia mais tempo, pois éramos amigos havia mais de 70 anos!

Washington e Luiz Antônio Castro Lima no almoço de 2013



Depois desse agradabilíssimo evento, Leilah e eu visitamos Luiz Antônio e Kilza, pelo menos duas vezes, em São Paulo, conversamos por telefone de vez em quando e passamos, também, a nos comunicar por WhatsApp. Ele vinha tendo alguns problemas de saúde que o enfraqueceram, de tal forma que, em 29 de março de 2021, recebemos a seguinte mensagem da Kilza:

“Caríssimos Leilah e Washington,

Lamento ter de participar a triste notícia. Luiz Antonio nos deixou nesta sexta feira...

Agora, são só saudades.

Votos de saúde a todos vocês.

Abraço, Kilza”

A tristeza em nossa família foi muito grande; além de nós, Leilah e eu, nossos filhos gostavam muito do grande amigo. Desde então, desejo muito escrever sobre nossa amizade e só este mês criei coragem para controlar a emoção e publicar esta crônica.


Luiz Antônio e eu nos conhecemos porque meus pais eram amigos de seus pais. Ele era da mesma idade que eu – dois meses mais moço. Tornamo-nos amigos aos onze anos.

No livro Osmar e Jurema (sobre meus pais), conto assim:

"Uma grande amizade de Jurema e Osmar, que duraria a vida toda, foi a que tiveram com D. Iracema e Dr. Renato. Conheceram-se porque ela era irmã de Dona Irene, amiga dos tempos da Pensão Brasil. O casal tinha três filhos: Luiz Gastão, mais velho que o Túlio (meu irmão mais velho) , Luiz Antônio, da minha idade e Ana Lúcia, que regulava com a Maria da Penha (minha irmã). D. Iracema era uma mulher ativa, sociável, gostava de participar das atividades dos filhos e seus amigos, e Dr. Renato, advogado, um senhor calmo, intelectual, não deixava transparecer que tinha em seu currículo as atividades de delegado de polícia no interior do Estado de São Paulo."

É admirável que minha amizade com Luiz Antônio, tão longa, tenha se mantido, apesar de termos seguido carreiras muito diferentes, de termos morado, a maior parte do tempo, em distintas cidades. Ao longo dos anos encontrávamo-nos e nos comunicávamos com alguma frequência e, em cada oportunidade, era como se tivéssemos nos visto na véspera.


Vêm-me à lembrança os vários encontros que tivemos durante nossa duradoura amizade.

Os meninos, Luiz Antônio e eu, moravam em bairros diferentes, distantes um do outro, mas as famílias se visitavam. De vez em quando, íamos à Vila Mariana e eles a Heliópolis (um bairro distante do centro da cidade, tranquilo, com ares de cidade do interior).

Tivemos boa convivência. Uma ocasião, quando minha mãe teve de ir ao Paraná para ver os parentes, eu estava iniciando o curso ginasial e já não podia ir com ela. Fiquei hospedado por cerca de um mês na casa do Luiz Antônio. Algum tempo depois, ele passou algumas semanas de férias comigo em Ponta Grossa, ambos hospedados por tio Lascínio e tia Jósea, irmã de minha mãe.

Lá pelos nossos doze anos, ambos no ginásio, eu ainda não pensava em carreira profissional, mas Luiz Antônio já tinha decidido que seria oficial da Marinha. Eu relacionava essa escolha com o fato de que ele nadava muito bem e até saltava de plataformas. Pois ele viria mesmo a fazer o curso da Escola Naval e a carreira de  oficial da Marinha.

Jovens, já formados (ele oficial da Marinha e eu, engenheiro), ele morando no Rio e eu em São Paulo, nos encontrávamos principalmente nas férias. Estivemos, mais de uma vez, com outros amigos, na casa de praia que os pais dele tinham em São Sebastião, no litoral norte do estado de São Paulo. Eram reuniões excelentes, de jovens adultos, gerenciadas firmemente por D. Iracema.

Quando entrei na IBM, uma das fases do treinamento inicial foi feita no Rio. Nessa ocasião, Luiz Antônio, ainda solteiro, me hospedou no apartamento dele.

Luiz Antônio e Kilza Setti se casaram algum tempo depois de meu casamento com Leilah. Esta já conhecia Kilza, musicista, compositora, porque a irmã dela, Odileia, era sua contemporânea na Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo.

Tornamo-nos, então, casais amigos. E mais, eles também mantiveram amizade com Maria da Penha, minha irmã, e Roberto, seu marido, em cuja casa, em São Paulo, costumávamos nos encontrar quando, já residentes no Rio, íamos a São Paulo.

Quando me mudei para o Rio, Luiz Antônio não estava morando aqui, estava servindo em outra cidade, mas, na década de 1980, voltou ao Rio em designação temporária, instalando-se em um apartamento que tinha em Ipanema. Kilza e as duas filhas permaneceram em São Paulo, onde ele passava os fins de semana. Nesta fase, ele veio jantar muitas vezes conosco, tornando-se amigo também de meus filhos. Uma das vezes que a Kilza veio ao Rio no final de semana, nos ofereceu uma bela lasanha, por ela preparada.

Luiz Antônio, após servir a Marinha em várias cidades, foi reformado pela idade e fixou definitivamente residência em São Paulo. Em nossas viagens a essa cidade, nosso programa incluía um encontro com o casal. Uma ocasião, Leilah e eu fomos, do Rio, visitá-los na casa que tinham em Itamambuca, praia do município de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo. Mantínhamos, portanto, contato frequente com eles.

Quando viajar, para nós, idosos, ficou difícil e, depois, quando sobreveio a pandemia da Covid-19, nossa convivência se reduziu a comunicações telefônicas.


Na vida, amigos não contabilizam gentilezas e atenções. Contudo, acho que fiquei devedor a ele por um grande favor, quando, conforme já mencionei, ele me hospedou no Rio em 1960.

Quando entrei na IBM, em São Paulo, a primeira atividade do nosso grupo de profissionais, admitido para a comercialização e instalação de computadores, foi um intenso treinamento técnico, realizado parte em São Paulo e parte no Rio de Janeiro. Na fase do Rio, recém-casado, vim com a Leilah à Cidade Maravilhosa para escolher o hotel em que deveria me hospedar por cerca de dois meses. Embora estivéssemos procurando um apenas confortável, nada de luxo, tivemos muita dificuldade para encontrar aquele que satisfizesse, dentro da verba estabelecida pela IBM (condição diferente da que tivemos depois, ao longo da carreira na empresa, quando viajávamos a trabalho: o orçamento permitia hospedarmo-nos em hotéis muito bons). Fui, então, procurar o Luiz Antônio que, ainda solteiro, morava em seu apartamento no bairro de Laranjeiras. Ele me hospedou pela temporada e eu pagava apenas minhas despesas. Em casa, tomávamos o café da manhã e fazíamos lanche à noite. Os fins de semana eu passava em São Paulo.

Foi uma extraordinária gentileza que ele fez da forma mais natural, simples, como era de seu feitio. Favor inesquecível!


Meu grande amigo de infância, o garoto exemplar que inspirou meus pais a darem o nome Luiz Antônio ao meu irmão caçula, manteve-se, até a idade provecta, uma pessoa extremamente simpática, de convivência muito agradável. Deixou muita saudade, sim, como disse Kilza, mas na sua lembrança nossa amizade continua e, em 2023, completará oitenta anos.

Washington Luiz Bastos Conceição


quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Uma surpresa muito agradável

Meus amigos e os leitores de meu livro “O Projeto 3.7 e Nós” (ou, em sua versão em Inglês, “The Project 3.7 and Us”) sabem que eu, esposa e filhos moramos na área  metropolitana de Chicago por cerca de um ano e meio, no final da década de 1960. Nessa temporada tivemos, a família, a experiência de vida naquela região dos Estados Unidos e eu, a de trabalhar em um projeto da IBM, fazendo parte de uma equipe internacional muito interessante.

No livro, descrevo essa equipe assim:

“Em resumo, a equipe do projeto era constituída por dois grupos – o dos representantes da IBM Estados Unidos (chamada “Doméstica”) e aquele formado por representantes da IBM Internacional (chamada “World Trade”), a qual incluía as empresas IBM de todos os demais países. O gerente geral do Programa era o Ted Armstrong e o gerente do grupo da “World Trade” era o Fred Piethe, um dos representantes alemães. Este e todo o grupo americano se reportavam ao Ted...”

“No grupo americano, além dos representantes, estavam o Especialista Administrativo, duas secretárias e o Commercial Artist, responsável pela criação das ilustrações de nosso material de Marketing e de Educação.”

O “Commercial Artist” era o James Kelly, que apresentei assim:

“Talvez o mais jovem do grupo dentre os homens, muito simpático e agradável, James Kelly Jr., o Jim, era o “Commercial Artist” do projeto. Formado em Desenho Industrial, era o responsável pelas ilustrações do sistema e dos diagramas necessários que eram incorporados ao material de cursos e de anúncio do sistema”... “Jim Kelly tinha uma aparência muito boa, era alto (cerca de 1,80m), pele clara, cabelos castanhos, devia ter uns 25 anos. Gostava de música, particularmente de bossa nova. Em nossas primeiras conversas ele fez questão de dizer que era um fã entusiasta do Tom Jobim, que tinha muitos discos com músicas dele, inclusive as gravações do Sinatra, do Tom com o Sinatra e também gostava muito do Sergio Mendes. Foi ele que me indicou as gravações de bossa nova que comprei lá.”


No encerramento de nosso trabalho em Chicago, as despedidas foram momentos um tanto tristes, apenas amenizados pelas perspectivas de novos desafios de trabalho de cada um em seus país, a satisfação de termos tido êxito em nossa empreitada e a possibilidade de nos vermos novamente. Promessas de comunicação entre nós, até de visitas aos mais chegados, foram feitas. De minha parte, muito poucas foram cumpridas. Na verdade, eu viria a trocar alguma correspondência com o Juan Garcia Escribano (o espanhol), a desencontrar-me dele quando estive em Madri, em 1972, a visitar o Emiliano Balladore (o italiano) em Milão, no mesmo ano, e, por puro acaso, a encontrar-me em White Plains, Nova York, com o Hiroaki Fujita (o japonês) treze anos depois (em 1982).


Quando meu filho Cássio, que mora na Califórnia, veio nos visitar em setembro, trouxe-me a notícia de que fora contatado pelo Jim Kelly, que lhe enviou o seu endereço de e-mail. O resultado foi iniciarmos, Jim e eu, uma comunicação por e-mail após 53 anos, ambos idosos (eu mais do que ele) com troca de informações e fotos das famílias.

Da mesma forma que eu me recordei, ao escrever o livro, das nossas conversas sobre música brasileira, ele lembrou, agora, de que, em uma visita a nossa casa em Prospect Heights, decidiram, ele e Chris, namorar firme – e se casaram algum tempo depois. E Jim ainda se lembrou de que a Leilah fez, no almoço,  um delicioso prato com palmito (“heart of palm”, difícil de achar naquele tempo, importado do Brasil).

Continuamos nos “falando”, temos o que contar sobre filhos e netos, temos o que falar do tempo de nosso trabalho.


Esse surpreendente reencontro me trouxe muita satisfação e, especialmente, a emoção de saber de um colega-amigo de quem eu nunca mais havia tido notícia. E me fez pensar quanto devemos ao desenvolvimento tecnológico. Particularmente, à Internet, pois o Jim tomou conhecimento da publicação de meus livros na Amazon, tentou me localizar e, com a ajuda de uma de suas filhas, conseguiu se comunicar com o Cássio.

Foi, portanto, um mágico, maravilhoso, excepcional reencontro internético.

Washington Luiz Bastos Conceição


Nota:

Procurei a palavra “internético” no dicionário “Aurélio on line” e não encontrei. Propus o neologismo.

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Tempo de Leitura – com Érico Veríssimo

Após um período de ler, quase que exclusivamente, livros e outras publicações como base para meus escritos, voltei à leitura de lazer. Há dois meses, resolvi ler e reler obras de Érico Veríssimo, começando com o Solo de Clarineta, seu livro de memórias, impresso, que temos em nossa estante há anos e eu não tinha lido ainda. Paralelamente, li, na versão e-book, os romances “Caminhos Cruzados”, “Clarissa” e “Olhai os lírios do campo”.

Essa curiosa forma de leitura concomitante me permitiu acompanhar as observações que o autor fazia, na autobiografia, sobre os personagens de seus romances.

Pela experiência que adquiri com meus escritos, ao mesmo tempo que aprecio os livros, tenho observado a forma de escrever do autor, seus enfoques, seus “cortes” de cenas, suas descrições dos ambientes e dos personagens, com as respectivas características físicas e mentais.

Meu pai tinha admiração por outros escritores, como Lígia Fagundes Teles, por exemplo, que ele conhecia pessoalmente, mas observei que Érico Veríssimo era seu escritor favorito, no que minha mãe o acompanhava. Daí a oportunidade que tive de ler, na juventude, vários de seus livros, especialmente a trilogia do Tempo e o Vento, certamente sua obra-prima. Contudo, embora tivesse em casa, há muitos anos, os dois volumes do “Solo de Clarineta” (que Leilah, minha esposa, leu e apreciou muito) somente este ano lembrei-me do livro e resolvi ler. Talvez tivesse mesmo de acontecer assim, pois estou podendo usufruir mais do livro depois que ganhei experiência ao contar minhas próprias histórias.

Além de nos narrar, de forma aberta e sem autocomplacência, os fatos de sua vida, desde a infância, ele expõe seus sentimentos e suas impressões durante as ocorrências. Em particular, comenta como concebeu e desenvolveu seus romances, como criou seus personagens. Muitos destes, inspirados em pessoas conhecidas (várias de sua família), personagens que ele criava e, depois, ao longo da história, ganhavam, segundo ele, vida própria. Exemplos são médicos que aparecem em seus romances, dedicados e magnânimos, personagens inspirados no avô paterno de Érico, e o Capitão Rodrigo, do Tempo e Vento, que, em parte, tinha características do pai do autor.

Algo que me impressionou muito foi a menção dos livros que Érico leu desde sua juventude, não só pela quantidade, como pela variedade e importância dos autores. Ele se valeu muito de seu conhecimento de vários idiomas, principalmente do Francês e do Inglês, além do Português e do Espanhol. Erudito, mencionou com frequência frases de escritores célebres. Particularmente, me deixou envergonhado quando, ao contar sua viagem à Grécia, em que visitou vários locais históricos, mostrou familiaridade com a mitologia grega e com filósofos, poetas e dramaturgos da Grécia antiga, citando pronunciamentos deles. Também é notável sua menção frequente de obras de música clássica, em que demonstrou conhecimento respeitável. A rica biblioteca e o gramofone de seu pai proporcionaram a Érico a oportunidade de boa leitura e de ouvir boa música desde a infância. 

O “Olhai os lírios do campo”, livro que impulsionou sua destacada carreira de escritor, li ainda jovem (há mais de setenta anos) e reli agora. Impressionou-me como eu não me lembrava nada da história, de forma que valeu como primeira leitura. Dramático, o romance aborda assuntos delicados da sociedade, com personagens fortes de comportamento característico e de diferentes camadas sociais. Nestes dias, estou mergulhado no “O Continente”, da trilogia “O Tempo e o Vento”; já reencontrei Ana Terra, Pedro Missioneiro e Pedro Terra e estou revendo agora um certo Capitão Rodrigo, que surge na história ao entrar em uma venda da pequena Santa Fé e saudar os presentes com a frase da qual jamais me esqueci. Foi assim:

“Apeou na frente da venda do Nicolau, amarrou o alazão no tronco dum cinamomo, entrou arrastando as esporas, batendo na coxa direita com o rebenque, e foi logo gritando, assim com ar de velho conhecido: — Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos grandes dou de talho!”

Tenho vários livros por ler que ganhei recentemente, mas, no meu hábito de leituras concomitantes de livros impressos e de e-books, sei que vou me manter na companhia de Érico Veríssimo por mais um bom tempo.

Washington Luiz Bastos Conceição


Nota:

Cara leitora,  ou prezado leitor:

Meu hábito de leituras concomitantes foi causado pela dificuldade que tenho em ler livros impressos na cama, ao me deitar – eles se tornaram pesados para mim, não me ajeito ao sentar-me na cama e uma iluminação mais forte pode perturbar minha cara metade. Em consequência, essa leitura noturna é feita em e-books, no telefone celular, onde tenho minha biblioteca particular. Os livros impressos são lidos em poltrona da sala de estar, onde também leio e-books (aliás, como vivo comentando, estes leio até nas salas de espera de médicos, dentistas e laboratórios clínicos).

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

“Um casal de idosos no tempo do vírus” em novas versões

A versão impressa

Em 17 de julho, noticiei neste blog a publicação do livro “Um casal de idosos no tempo do vírus” em versão digital (e-book). Na ocasião, expliquei que, como me pareceu importante publicar em livro o que um casal idoso passou nessa temporada de isolamento social intenso, reuni nele as crônicas sobre o assunto publicadas neste blog, mantendo as impressões e os sentimentos vividos e comentados em cada fase da pandemia. A leitura das crônicas, em sequência, deverá ser interessante, mesmo para aqueles que tenham lido toda a série.


Hoje, venho anunciar a publicação do livro na versão impressa, que apresento com a seguinte sinopse:

“Quando o Covid19 atacou a humanidade, Leilah e Washington, octogenários, tiveram de se recolher ao isolamento social. Nessa condição inédita, vivida no mundo todo, sobreviveram à fase mais grave da pandemia. O livro registra o dia a dia dos dois, no período de março de 2020 a março de 2022, as dificuldades, sua forma de enfrentá-las, suas atividades e seu controle pessoal para não se deixarem abater. Nos tempos mais difíceis, analisavam aquela situação esdrúxula, estapafúrdia mesmo, que estavam vivendo, sentindo-se infelizes por estarem privados de ver os filhos e netos, de estarem com os amigos, de passearem livremente pela cidade maravilhosa. A pergunta se repetia: “Até quando?”.

A expectativa do autor é que os fatos aqui narrados venham a ser de interesse para nossos pósteros e que, para os sobreviventes da pandemia, servirão de lembrança. Sim, para que não esqueçamos.”

As capas e lombada

Resultou um livro de 113 páginas, no tamanho 15cm X 23cm (6pol x 9pol) com capa mole.

No Brasil, está disponível na Loja Uiclap, “link”:

https://loja.uiclap.com/titulo/ua20130/

e na Amazon.com.br, “link”:

https://www.amazon.com.br/Um-casal-idosos-tempo-v%C3%ADrus/dp/B0BBPVNR34/ref=sr_1_2?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&crid=U7VYGRSHCDOH&keywords=um+casal+de+idosos+no+tempo+do+virus&qid=1661374958&sprefix=um+casal+de+idosos+no+tempo+do+virus%2Caps%2C216&sr=8-2 .


O e-book em Inglês: “An elderly couple in the time of the virus”

Tratando-se de uma pandemia, ou seja, uma epidemia que se estendeu por todo o globo, e sendo as medidas de prevenção e de combate ao vírus semelhantes no mundo todo, parece-me que o depoimento contido no livro poderá ser de interesse também no exterior. Por essa razão, embora eu tenha perdido a prática da escrita em Inglês, ousei preparar um rascunho de versão do texto do livro para esse idioma e pedi a meu filho Cássio que fizesse uma revisão, corrigindo erros graves. Ele decidiu rever para valer e resultou um texto de muito boa qualidade. Foi, portanto, com grande satisfação, que publiquei nesta semana o e-book em Inglês.

A capa do e-book


Disponibilidade

Em resumo, a disponibilidade das versões do livro, hoje, é:

No Brasil, os e-books em Português e Inglês estão disponíveis na Amazon.com.br e o livro impresso em Português, na Loja Uiclap e na Amazon.com.br.

No exterior, os e-books em Português e Inglês, bem como a versão impressa em Português, estão disponíveis nas lojas: Amazon.com (Estados Unidos); Amazon.co.uk (Reino Unido); Amazon.de (Alemanha); Amazon.fr (França); Amazon.in (Índia); Amazon.co.jp (Japão); Amazon.es (Espanha) e Amazon.it (Itália). Nesses sites, basta digitar meu nome completo (Washington Luiz Bastos Conceição), no campo de pesquisa, para abrir a página com a descrição de meus livros.


Comentário

Embora haja essa facilidade extraordinária de acesso aos meus livros, que são vários e têm preços convidativos, eu, como escritor independente, tenho de tomar algumas providências para que os leitores em potencial tenham oportunidade de adquirir aqueles que lhes interessem.

A providência fundamental, obviamente, é a divulgação, que venho fazendo no blog e mediante comunicação aos amigos por WhatsApp, Facebook e e-mail; mas devo ampliá-la.

Outra ação é publicar todos os livros nas versões impressa e digital, a primeira por causa da preferência da maioria de meus conhecidos e a segunda porque oferece vantagens importantes que, espero, deverão fazer com que mais pessoas experimentem os e-books e se tornem adeptos de sua leitura (As vantagens dos e-books venho divulgando há já um bom tempo, tão insistentemente que Leilah, minha esposa, pediu para eu dar um descanso do assunto para meus leitores do blog).

Como, no exterior, o idioma Português restringe muito o potencial de leitores, pretendo publicar, quando possível, edições de livros em Inglês e outros idiomas.


Quanto às crônicas, prezada leitora ou caro leitor, até a próxima!

Washington Luiz Bastos Conceição


terça-feira, 12 de julho de 2022

“Um casal de idosos no tempo do vírus” - o livro

Acabo de publicar o e-book que reúne as crônicas da série “Um casal de idosos no tempo do vírus”.

Quando, em março de 2020, a população brasileira teve de entrar em isolamento social, Leilah, minha esposa, e eu, idosos octogenários, estávamos relativamente bem; em atividade em casa, visitando e recebendo os filhos, netos e amigos,  fazendo os tratamentos médicos necessários e até exercícios físicos, programados para nossas condições específicas, na academia do clube. Enfim, estávamos levando uma vida normal para nossa idade. O isolamento social alterou profundamente nossa vida (como, aliás, aconteceu com todos os nossos conhecidos).

Diante de situação tão insólita, decidi registrar o comportamento e atividades do casal no primeiro mês, por meio de uma crônica publicada em meu blog. Com a continuidade do isolamento, passei a publicar crônicas sobre o assunto que acabaram formando uma série. Meus depoimentos incluíram muita atividade doméstica, nossa visão dos acontecimentos, nossa reação às dificuldades do isolamento social, enfim nosso tipo de vida durante a pandemia. Imaginei que, com pequenas variações, nossa situação seria semelhante à de outros casais idosos, classe média, aposentados, residentes em uma cidade grande, no Brasil.

Mais do que eu esperava, as pessoas que comentaram as crônicas diziam, com frequência, que a situação delas era semelhante (“Durante a leitura, parecia-me estar diante de um espelho a refletir a rotina daqui de casa.”, escreveu um dos meus primos do Paraná). E vários desses leitores não tinham perfil semelhante ao nosso.

Em março último, quando se completaram dois anos de pandemia, escrevi a última crônica da série. Nestes três últimos meses, constatei que entramos em uma fase cujas condições não vão se alterar tão cedo, parecendo que este “modus vivendi” já é, por um bom tempo, o “novo normal”; pois, embora permaneça o risco da doença porque o vírus não foi neutralizado, a vacinação prossegue, os protocolos estão menos rigorosos e as atividades das pessoas estão sendo totalmente retomadas. Em nosso caso específico, entramos em comportamento social prudente, menos rígido nos cuidados que tomávamos no início do isolamento.

Como me pareceu importante publicar em livro o que um casal idoso passou nessa temporada de isolamento social intenso, reuni nele as crônicas, mantendo as impressões e os sentimentos vividos e comentados em cada fase da pandemia. Parece-me que a leitura das crônicas, em sequência, deverá ser interessante mesmo para aqueles que tenham lido toda a série.

Decidi publicar primeiro o e-book, de forma que as prezadas leitoras e caros leitores possam ter a conveniência de ler no seu celular, ou tablet, ou computador, bastando para tanto baixar o aplicativo Kindle, gratuitamente, nos seus dispositivos eletrônicos. O preço do e-book é bem baixo e a entrega da Amazon é imediata. No Brasil, ele está disponível na amazon.com.br; link:

https://www.amazon.com.br/casal-idosos-tempo-v%C3%ADrus-isolamento-ebook/dp/B0B69W27JC/ref=sr_1_4?crid=1W35O24HUWJ45&keywords=washington+luiz+bastos&qid=1657661817&sprefix=%2Caps%2C313&sr=8-4 

Fora do Brasil, na amazon.com; link:

https://www.amazon.com/-/pt/dp/B0B69W27JC/ref=sr_1_1?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&crid=32FEZLWHL68UP&keywords=washington+luiz+bastos+conceicao&qid=1657700824&s=digital-text&sprefix=washington+luiz+bastos+conceicao%2Cdigital-text%2C209&sr=1-1

Como leitor habitual de e-books, não posso deixar de lembrar suas vantagens, entre elas a possibilidade de podermos ler, onde estivermos,  qualquer dos livros de nossa biblioteca digital (por exemplo, na sala de espera de um médico, usando o celular). Também podemos ter o acesso imediato a dicionários digitais e a apresentação de imagens coloridas, algo que encarece muito o livro impresso.

Contudo, sei que muitos conhecidos meus preferem ler livros impressos – querem senti-los fisicamente. Por essa razão estou preparando também a versão impressa deste livro.

Abaixo, a capa do e-book e a descrição, resumida, do conteúdo livro:


“Quando o Covid19 atacou a humanidade, Leilah e Washington, octogenários, tiveram de se recolher ao isolamento social. Nessa condição inédita, vivida no mundo todo, sobreviveram à fase mais grave da pandemia. O livro registra o dia a dia dos dois no período de março de 2020 a março de 2022, as dificuldades, sua forma de enfrentá-las, suas atividades e seu controle pessoal para não se deixarem abater. Nos tempos mais difíceis, analisavam aquela situação esdrúxula, estapafúrdia mesmo, que estavam vivendo, sentindo-se infelizes por estarem privados de ver os filhos e netos, de estarem com os amigos, de passearem livremente pela cidade maravilhosa. A pergunta se repetia: “Até quando?”.

A expectativa do autor é que os fatos aqui narrados venham a ser de interesse para nossos pósteros e que, para os sobreviventes da pandemia, servirão de lembrança. Sim, para que não esqueçamos.”

Washington Luiz Bastos Conceição





sexta-feira, 24 de junho de 2022

Os novos softwares e o velho usuário

Na crônica “Vovó Jurema vai à Europa”, que publiquei há alguns dias, conto que minha mãe registrou, em um pequeno caderno de capa preta, informações diárias sobre algumas de suas viagens ao exterior, com letra clara e bonita. Uma dessas viagens foi sua primeira à Europa, em 1963, com anotações que me pareceram muito ilustrativas das condições e recursos oferecidos aos turistas em um “giro” à Europa daquele tempo.

Avaliei que essas anotações, comentadas, seriam de interesse para a família, amigos e, em parte, para os demais leitores de minhas crônicas. Decidi levá-las ao computador.

Acontece que sou um digitador incompetente, nunca pratiquei datilografia, uso só os dois indicadores. Como não cogitei de contratar alguém para o serviço, decidi ler o caderno ditando para o computador. Eu já havia testado, como curiosidade, o ditado no Word; funcionou.

Passei, então, a ler as anotações de Jurema no livro preto, ditando para o Word. Deu certo.

Resultou um texto de 9019 palavras, correspondendo a 35 páginas de livro no tamanho 14,8cm X 21cm.

Claro, tive um bom trabalho de edição, além das correções feitas durante o ditado.


Veterano de Informática (atualmente, denominada "TI - Tecnologia da Informação"), desde o tempo em que era chamada "Processamento de Dados", sou, hoje, um “usuário” de PC ("Personal Computer") e do omnipresente telefone celular.

Como estou me desempenhando com o celular, aparelho mágico, poderoso, que nos serve tanto, mas também nos domina? Tenho tirado muito proveito de sua função original, a comunicação telefônica, de seus aplicativos de mensagens, principalmente do WhatsApp, e da leitura de e-books. Com ele, também tiro fotos (nada artísticas) e uso a Internet, recorrendo frequentemente ao Google para pesquisas. Como operador, reconheço que sou primário, pois, além da dificuldade de entrar com dados mediante toque na tela com os dedos, ainda esqueço de como fazer algumas operações, especialmente aquelas necessárias só de  vez em quando. O ponto alto de seu uso é realmente a comunicação instantânea com pessoas de todo o planeta.

Meus trabalhos de aposentado, principalmente de escrita, faço no PC, meu velho conhecido, enriquecido com a ligação à Internet, usando muito as aplicações: de processamento de textos (o Word), de produção e apresentação de “slides” (o Powerpoint) e de planilhas eletrônicas (o Excel). No dia a dia, uso também o “e-mail” e o software de leitura de e-books (o programa Kindle).

A minha longa convivência com os computadores (desde 1959, quando comecei a trabalhar na IBM) me faz refletir sobre a evolução dos sistemas eletrônicos, tanto do hardware como do software, e do seu progressivo relacionamento com os sistemas de comunicação.

No começo da década de 1980, eu, na IBM, era um usuário indireto dos sistemas internos da empresa. Os profissionais dos vários departamentos já trabalhavam com terminais ligados ao computador central (o “mainframe”). Como gerente de meu setor, eu me valia dos serviços da secretária e dos analistas de sistema, de modo que utilizava, quando necessário, seus terminais. Por exemplo, para me comunicar com um dos analistas que estava trabalhando temporariamente nos Estados Unidos. Ainda não havia a Internet, mas a IBM tinha uma rede própria internacional, mediante a qual podíamos, entre outras operações, trocar mensagens e, mesmo, “conversar” por escrito (o que hoje se chama “chat”).

Quando deixei a IBM, em 1983, estavam surgindo, no Brasil, os primeiros computadores pessoais (de capacidade e desempenho limitados), de tecnologia estrangeira, mas montados aqui, por força da reserva de mercado então estabelecida pelo Governo. Leilah e eu havíamos conseguido comprar um CP-500, que correspondia ao TRS-80 (da Tandy Corporation, vendido pela Radio Shack), o que nos proporcionou a iniciação com os computadores pessoais.

O maior proveito que tive do CP-500 foi o aprendizado e uso de um programa de planilhas chamado Visicalc. Leilah conseguiu uma cópia do manual do software, eu estudei e pratiquei, achando o produto excelente. Era o bisavô do Excel, tinha muito menos flexibilidade e recursos do que seu bisneto, mas era fantástico quando comparado com as planilhas manuais construídas com o auxílio de calculadoras.

Quando, em meu trabalho individual, em casa e nos clientes, passei a usar o PC-XT, de arquitetura IBM, fabricado no Brasil por empresas nacionais, o trabalho de planilhas era feito com um software de mais recursos, cujo nome era muito curioso, Lotus 1-2-3; e o processamento de textos com o Wordstar, então o encanto das secretárias, pois era uma ferramenta de muitos recursos, avançada no seu tempo.

Mais alguns anos, já na década de 1990, passei a usar o Windows, sistema operacional, o Word, o Excel e o Powerpoint, produtos da Microsoft. Estes, aperfeiçoados em versões sucessivas, uso até hoje. Nas minhas atividades de aposentado, são plenamente satisfatórios para mim.

O Powerpoint, que usei muito em apresentações a clientes, evoluiu bastante; eu o utilizo, agora, principalmente para montagens gráficas, como, por exemplo, os quadros de fotografias que anexo aos e-mails que envio aos amigos no final de ano. Nesses trabalhos, corto fotos, ajusto seus tamanhos, faço os alinhamentos necessários e acrescento textos e legendas.

Continuo usando o Excel, mas as planilhas de administração doméstica são  simples, quando comparadas com aquelas que eu fazia nos clientes, onde fiz até programação por "macros" complicadas.

Como o que faço mais é escrever, o Word é o software que mais uso. Ele tem, atualmente, muitos recursos; não uso todos, mas estou recorrendo agora, além do ditado, à tradução. A versão para o Inglês, por exemplo, está bem aproveitável, exigindo pouca revisão.

Mas, realmente, o que me surpreendeu foi o recurso do ditado. Funciona bem, embora nem sempre minhas palavras sejam bem compreendidas, o que é resolvido com atenção e revisão; também, é difícil comandar a pontuação por voz, de modo que prefiro fazer a pontuação pelo teclado, o qual pode ser usado ao mesmo tempo que se faz o ditado; ou seja, mesmo quando está em modo ditado (microfone ligado), o programa recebe os sinais do teclado.

Durante o trabalho, aprendi a ter o cuidado de desligar o microfone no Word quando tenho de falar alguma coisa com a Leilah ou atender o telefone. A maior surpresa que tive ao usar o ditado foi quando, muito admirado com o que minha mãe estava contando, usei uma exclamação imprópria: as letras da má palavra foram convertidas em asteriscos! Morri de rir.

Washington Luiz Bastos Conceição


terça-feira, 7 de junho de 2022

Vovó Jurema vai à Europa

Cara leitora,  ou prezado leitor:

Em meu livro “Osmar e Jurema”, eu menciono que Jurema, minha mãe, gostava muito de viajar, pelo país e pelo exterior. O que eu não sabia é que ela fez alguns diários de viagem, muito interessantes e ilustrativos de sua época.

Inês, esposa de meu irmão Luiz Antônio, descobriu, no ano passado, entre os guardados de Jurema, um pequeno caderno de capa preta que fez a grande gentileza de me enviar. Nele, minha mãe registrou várias informações sobre algumas de suas viagens ao exterior, com minúcias sobre orçamentos, despesas, encomendas que lhe faziam, presentes que pretendia comprar e, principalmente, suas impressões diárias dos lugares que visitava, com letra clara e bonita. Penso que o tamanho do caderno foi escolhido para caber em suas bolsas (11cm X 15cm), com cerca de 100 folhas.

Exemplo de escrita de Jurema no diário

Em meus escritos, já comentei as viagens que ela fazia, de trem, quando, jovem esposa, já morando em São Paulo, ia ao Paraná visitar os parentes; e quando, bem mais tarde, visitava os filhos que moravam em Franca e minha família, no Rio de Janeiro. Também escrevi sobre a visita que ela e Osmar, meu pai, nos fizeram (a mim, Leilah e filhos), quando estávamos morando em Chicago, e a viagem de São Paulo à Califórnia que dona Jurema fez, comigo e Leilah, para comparecer à cerimônia de casamento de meu filho Cássio. Não sei se ela fez algum registro dessas viagens, mas no caderno de capa preta encontrei os diários de duas viagens à Europa e uma, de ônibus, ao Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina.

Nesta crônica, comento a viagem que ela fez, em 1963, à Europa. A viagem foi longa, de modo que a crônica resultou extensa. Se o caro leitor ou prezada leitora não estiver com tempo, pode ler em etapas, fazendo uma parada em Paris e outra em Viena, por exemplo.


Em sua primeira viagem à Europa, em 1963, Jurema teve a companhia da Maninha (ou seja, Celina, sua meia-sobrinha e amiga, já viúva, aproximadamente da mesma idade). Ambas eram avós; Jurema, então com 53 anos de idade, já tinha seis netos.

Era um tempo em que pessoas da classe média já podiam, com muito esforço, viajar à Europa, o que, até a década anterior, era exclusividade de pessoas mais abonadas. E as viagens, para valerem a pena, compreendiam a visita às principais  cidades de vários países. Era diferente do que acontece hoje em dia: na maioria dos casos, o roteiro compreende algumas cidades e, ainda, há aqueles viajantes eméritos que preferem conhecer o mundo todo, em viagens específicas. Por exemplo, uma para as Ilhas Maldívas e outra à Islândia, como fez um casal muito amigo nosso.

Meu pai não pôde acompanhá-las porque tinha compromissos de trabalho – aposentado como advogado, voltara a dar aulas. O planejamento da viagem foi feito sob orientação de uma agência de turismo que, além das reservas de passagens e de hotéis, providenciou para que houvesse atendimento local às viajantes em cada cidade que iriam visitar.

Ficou estabelecido o seguinte itinerário: São Paulo – Lisboa – Madri – Lourdes – Paris – Amsterdam – Colônia – Frankfurt – Zurich – Lucerna – Viena – Veneza – Florença – Roma – Nápoles – Nice – Barcelona – Lisboa – São Paulo. Em cada uma das cidades visitadas haveria excursões por lugares próximos, além da habitual viagem de barco pelo Reno, a partir de Colônia. Ufa! Seria uma grande prova para as jovens vovós.

As viajantes chegaram a Lisboa em 15 de agosto e, daquela cidade, voltaram ao Brasil em primeiro de outubro.


Ao longo desta crônica, vou destacar descrições e impressões que Jurema registrou em seu diário de viagem, que ela intitulou “Anotações de Viagem”. Realmente, sua redação tem a forma de registro das principais atividades, com descrições dos locais visitados, transmitindo suas impressões e sensações ao longo da viagem. Por essa razão, há uma espécie de itemização de registros, como as características de cada hotel, por exemplo.

Normalmente, as viagens foram aéreas, mas algumas foram de trem.

Observando os recursos tecnológicos daquele tempo e o atendimento oferecido aos viajantes, não pude evitar comparações com as viagens ao exterior que se fazem hoje em dia.


Jurema começou a fazer as anotações desde a viagem do Brasil a Portugal:

“Quase chegando em Lisboa, estou abrindo este diário de viagem. Esta começou ontem às 15:00h quando embarcamos em São Paulo. Uma hora e dez minutos depois, estávamos no aeroporto do Galeão para tomar este maravilhoso DC-8 da KLM. Nem sei dizer como é extraordinário viajar desta forma, pois eu, que sempre fui tão medrosa para avião, estou simplesmente encantada... agora às 6:20h, horário local naturalmente, apreciamos o amanhecer mais lindo que se possa imaginar. O horizonte é uma faixa em vermelho, laranja, amarelo e acima, então, começa um azul encantador para o resto do céu. É quase dia e já soubemos que dentro de poucos minutos desembarcaremos.”

Nota: O DC-8, tão elogiado por Jurema, foi o primeiro jato comercial produzido pela companhia norte-americana Douglas Aircraft Company.

Nessa primeira passagem por Portugal, de três dias, além de passearem por Lisboa, as viajantes foram, de trem, um dia para Cascais e Estoril e, em outro, para Coimbra.

Destaco o registro:

“Saímos logo cedo para tomar o comboio para Cascais e Estoril. Passeio agradável, muito lindo, à beira mar. Muita fruta e, no mercado que visitamos, havia enorme quantidade de peixes e mariscos, lagostas enormes, mas por preços enormes também. Voltamos a tempo de almoçar no Trindade, onde comemos fabulosa bacalhoada, regada a gostoso vinho branco. Descansamos e, depois, fomos trocar dinheiro e comprar passagens para irmos a Coimbra amanhã. E gastamos o resto da tarde passeando à nossa moda, isto é, muito a pé e um pouco de ônibus e de bonde. À noite, fomos jantar num restaurante típico, com cantores de fado, danças da terra etc. Muito animado o ambiente, porém dentro de absoluto respeito; se houvesse menos gente e menos espera, teríamos gostado mais. Chama-se “O Faia” e fica bem perto do hotel.”

De Lisboa, voaram para Madri.

Em Madri, visitaram o Museu del Prado, o Palácio Real, passearam bastante pela cidade e foram, uma noite, ao “Corral de La Morería”, onde assistiram a números musicais típicos, em “bom ambiente, animado, mas respeitável.” (observação de Jurema). Ainda fizeram uma excursão a Toledo, na qual apreciaram a viagem, a cidade histórica em si, a catedral e o Museu El Greco.

Em Madri, Jurema se encantou com o Palácio Real:

”...Ia me esquecendo de anotar que o hotel fica bem defronte ao Palácio Real e que neste momento terminou um programa de narrativa da história dos reinados da Espanha, acompanhada de música e iluminação por refletores do Palácio, espetáculo de grande beleza. Assistimos comodamente da janela de nosso quarto.”

Na visita ao palácio, comentou:

“...É da gente se maravilhar, tal a beleza e a suntuosidade desse palácio. Nunca, em minha vida, vi tanta coisa linda assim reunida: lustres que são verdadeiras joias, enormes, em ouro e cristal uns, outros em primoroso trabalho de bronze, numa orgia de faiscante cristal, sendo que o da sala do trono é em prata cinzelada, platina, inteiramente franjado e incrustrado de cintilantes cristais, feito por famosos artistas italianos. Engraçado, como me pus a falar dos lustres, pois dessa parte os guias nem falam, por serem peças de segundo plano. Por aí pode-se calcular o tesouro que existe em tapeçarias, quadros, móveis, prataria, porcelana, mármore etc. Sei que vou ver outros palácios igualmente ricos, ou mais até, porém tenho certeza de que não vou esquecer desse espetáculo que foi dado aos meus olhos no dia de hoje.”

De Madri foram, de trem, para Lourdes, na França, onde estiveram no santuário, apreciando a impressionante manifestação religiosa dos visitantes. Jurema, entre outras observações, registrou:

“Desde ontem, estamos compenetradas do espírito religioso que traz milhares de peregrinos até aqui, todo mundo dando demonstração de muita fé e levando preces e cantando hinos à virgem, o dia todo e parte da noite. Ontem, assistimos à procissão luminosa, espetáculo grandioso e comovente. Hoje, muito cedo, já verdadeira multidão se acercava da basílica da Gruta, da cripta, enfim em toda a parte havia muita gente para assistir à missa e comungar. Todos rezando em voz alta, cantando, numa vibrante súplica aos céus. Nunca imaginei sentir emoção tão grande diante de um povo curvado assim em profunda oração.”

De Lourdes, voaram para Paris.

Em Paris, onde ficaram de 25 a 29 de agosto, visitaram os locais habituais de turismo, a avenida Champs Elysées, a Notre Dame, o Louvre, a Place Vendome, as ruas do centro, as margens do Sena e fizeram compras na Galeria Lafayette.

Encontraram e almoçaram com Tio Pedro, tio-avô do marido da Maria da Penha, Roberto.

Jurema foi a Versalhes e comentou:

“De lá viemos para o hotel e, logo em seguida, saía a excursão para Versalhes. Maninha preferiu ficar, pois já tinha feito essa visita quando aqui esteve de outra vez. Gostei demais, somando novos tesouros na minha lembrança. Entretanto, o que me encantou deveras foram os imensos e requintados jardins do Palácio. São tapetes coloridos entremeados por lagos, em cujas bordas existem estátuas ou enormes jarrões, ora em mármore, ora em bronze. Sei que valeu a pena eu ter resolvido ir.”

A partir de Paris, ao longo da viagem, uma das preocupações de Jurema era com as notícias de casa, que recebia mediante cartas (nem se cogitava tentar telefonar para o Brasil). Quando recebia, era uma festa.

Em Paris, ela anotou assim:

“Mais do que a chuva, a falta de notícias está nos aborrecendo, mas, como este dia 26 é uma data muito querida para mim, procuro dominar todos os pensamentos negativos e dar graças a Deus por tudo.”... e no dia seguinte: “O melhor de tudo aconteceu ao chegarmos ao hotel, pois achei cartas de casa - de Osmar, da Penha, do Washington e da Leilah, com comovente mensagem do Gigi (Luiz, neto de dois anos) para a Vovó Juju. Meu coração deu pulos, tão emocionada fiquei.”

A comparação com a facilidade da comunicação de hoje é inevitável. Nestes dias, meu neto carioca está fazendo uma viagem pela Europa e se comunica com a família diariamente, envia fotos, usando o telefone celular com o WhatsApp.

Uma curiosidade: constatei também que Jurema tomou, lá em Paris, conhecimento do restaurante tipo "bandejão", já em largo uso no Brasil, nas fábricas e universidades. A descrição dela da refeição no “restaurante estilo americano” é notável.

De Paris, as viajantes foram para Amsterdam, onde passaram dois dias. Passagem rápida, fizeram excursão pela cidade. Embora o tempo estivesse bom na chegada, tiveram depois muita chuva, mas aproveitaram a visita. Jurema registra no primeiro dia:

“30 de agosto – Amsterdam

A viagem de Paris para cá foi perfeita e nós demos graças a Deus por mais um voo sem alteração ou susto. O tempo favoreceu, com belíssimo céu e muito sol. Uma agente estava à nossa espera, como sempre, e fomos conduzidas ao hotel em confortável carro. A acomodação é a melhor de toda a viagem até aqui. Hotel fino, em prédio antigo, mas todo modernizado por dentro. O apartamento que nos deram, no quinto andar, é magnífico; provido de conforto, com linda vista do terraço, tudo em ordem e muito bem atendido. E, para completar a satisfação, deram-me logo à tarde uma cartinha da Penha, chegada hoje.”... “Vou contar mais um pouco desta cidade de encanto todo especial, parecendo uma gravura dos antigos contos de fada, onde, de repente, tivesse havido uma grande invasão de gente, de carros, tudo muito moderno numa profusão de luzes e de luminosos multicores. É um enorme aglomerado de prédios marrons, com alguns detalhes brancos como por exemplo, frisos e molduras de portas e janelas. Parece, contado assim, que o aspecto seja monótono, mas tal não acontece, porque é cidade de enorme movimento. O povo é igualmente interessante, de aparência muito saudável, dando a impressão de que tem tudo o que deseja. Amanhã haverá oportunidade de melhor conhecimento, já que vamos fazer a excursão de praxe para visitar o que houver de mais importante. Neste momento, ouvimos pelo rádio à nossa cabeceira um programa musical transmitido em cadeia. Lembrei-me, o dia todo, do aniversário da Márcia (neta), calculando neste momento que estejam reunidos apagando as velinhas. Mandei, ontem, de Paris, um cartão de cumprimentos.”

De Amsterdam, viajaram de avião para Dusseldorf, onde  tomaram um taxi para Colônia. Nesta cidade, não encontraram o agente de turismo à sua espera, mas conseguiram ir ao hotel, o que não deve ter sido fácil pela dificuldade de comunicação. Jurema não falava alemão (nem Inglês, que poderia ajudar); e, parece-me, era também o caso da Maninha. Aliás, essa é uma grande vantagem dos viajantes hoje em dia – em geral, na falta do conhecimento do idioma local, conseguem se comunicar usando o Inglês. Voltemos às anotações de Jurema:

”Chegando lá e não encontrando ninguém à nossa espera, tratamos de ir para o hotel, onde nos instalamos confortavelmente. Em seguida, almoçamos no próprio hotel, que se chama Augustinerplatz. Tudo ótimo e perfeitamente atendido. Mesmo com a dificuldade da língua, consegue-se viver muito bem no meio dos alemães.”... “À tarde, demos voltas pela cidade (que não é pequena como eu pensei: 800.000 habitantes) vendo um magnífico centro comercial. Lojas lindas, como poucas que já vi, uma ao lado da outra. tudo rico e de fino gosto. Depois, fomos à missa na famosa catedral. Esta, imponente e grandiosa, impressiona pela marcante austeridade. Ouvimos o órgão – maravilhoso - durante quase toda a cerimônia. De volta, chegamos a um restaurante que servia de tudo, tomando lá gostosíssimo chá com as celebradas tortas alemãs.”

A razão da falta do agente no primeiro dia foi problema de comunicação: a data de chegada delas, 1º. de setembro, foi entendida como 10 de setembro. No segundo dia foram atendidas e conduzidas para o embarque no vapor para a excursão no rio Reno, sobre a qual Jurema escreveu:

“No fim deu tudo certo e lá (em Colônia) embarcamos num trem que nos traria (viagem de uma hora) até determinado ponto de embarque deste pequeno vapor, às 11:50h. Havia quem nos esperasse e nos conduzisse ao porto e aqui estamos nós viajando há mais de três horas, desfrutando de panorama bonito e variado no convés do vapor repleto de turistas, na maioria americanos do Norte, como sempre. Trens passando a todo instante, tanto de um lado como do outro do rio, e estrada de rodagem, também, de ambos os lados. Aldeias ou pequenas cidades se repetem como se a gente estivesse desdobrando um álbum de postais, desses que se encontram em toda a parte. Os morros muito verdes a fazerem aveludado fundo para a formosa paisagem, sem contar o aparecimento, de quando em quando, de velhíssimos castelos, imponentes, sempre nos pontos mais altos.”

Do Reno, chegaram a Frankfurt, onde passaram apenas um dia; de lá seguiriam para Zurich. Apesar do pouco tempo, passearam pela cidade.

“Frankfurt, cidade simpática, tipo médio, aqui na Europa, agradou-nos bastante, embora Colônia entusiasmasse mais. Penso que a diferença está no tipo de comércio de Colônia, mais bonito, com artigos finos e de mais gosto. Frankfurt, se bem que maior, não conta com a especialidade deste ou daquele artigo, apresentando mesmo, em grande escala, só aparelhos como máquinas fotográficas, binóculos, rádios, máquinas de escrever etc. Pouco tempo tivemos para ver a cidade - um dia apenas - mas já deu para formar uma ideia das particularidades do lugar e do povo. O que não nos agradou foi a comida, certamente porque, não conhecendo nada da língua, não se pode pedir orientação aos garçons. O que salvou foi irmos jantar no “Mário”, restaurante italiano onde comemos gostosos canelones.”

De Frankfurt, voaram para Zurich. Chegaram bem. Jurema, em toda a viagem, comentava as instalações e serviços dos hotéis. Nessa cidade, ela anotou:

“Felizmente, correndo tudo bem aqui; estamos contentes em Zurich, instalados no hotel Stoller, o melhor de todo o percurso. Fino, simpático; o apartamento que nos deram, então, agradou em cheio. É a primeira vez que ficamos no térreo, de modo que é mais um ponto a favor. Terraço e janela dão para o quintal, de sorte que nem o barulho da rua vai nos incomodar. Voltando ao apartamento: um amor de bonito e com todo o conforto. até televisão tem. O banheiro é um encanto, todo em rosa e azul, até parece de propósito para as duas “meninas”. Almoçamos no hotel mesmo - comida gostosa e farta. Durante a tarde repousamos, e só no fim do dia foi que saímos para as nossas costumeiras voltinhas de reconhecimento da cidade. Esta é bem grande, muito movimentada, aparentando ser o que é na verdade: importante cidade de país civilizado e amigo da ordem e do bem-estar do seu povo. Bonita, tanto na parte mais antiga como na moderna. Muitas ruas comerciais, de lojas finíssimas, não só de moda como de joias e relógios, especialidade que o mundo todo conhece. Amanhã teremos, às 9:00h, excursão pelos pontos mais interessantes da cidade. Vai chegando a hora de nos acomodarmos, de maneira que aqui encerro mais esta coleção de garranchos e borrões.” (Cá entre nós, não eram “garranchos e borrões”. Os antigos, mais velhos do que ela, usavam esta expressão de modéstia; outra era “estas mal-traçadas linhas”).

Infelizmente, naquela data, 4 de setembro, ocorreu um grave acidente aéreo: um avião Caravelle da Swissair caiu logo após a decolagem do aeroporto de Zurich, causando a morte de seus 80 ocupantes, notícia de que elas tiveram conhecimento no dia seguinte. Foi muito difícil para Jurema, que dizia ter medo de voar. Suas anotações do dia 6, quando já estavam em Lucerna foram:

“Deixei de escrever ontem por ter ficado muito nervosa ao saber do grande desastre de aviação ocorrido, anteontem, em Zurich. Foi um choque para mim e para a Maninha, pois ambas temos feito voos sempre debaixo de grande tensão nervosa. E, com um acidente catastrófico como esse, só podíamos ficar abaladas. Mas já reagimos e hoje tivemos um dia calmo. Ontem, em Zurich, quase nada fizemos, não só pelo estado nervoso, como também pelo mau tempo reinante quase que o dia todo. Em todo o caso, desfrutamos bem do hotel que tudo indica seja o melhor do percurso todo. O daqui de Lucerna, por exemplo, não brilha muito pelo conforto E, em matéria de ordem, é assim-assim. Mas a cidade é o que há de engraçadinha, muito pitoresca, tendo como maior enfeite o lago muito verde, cruzado por pontes.”

De Lucerna voltaram de trem até Zurich, de onde voaram para Viena, onde chegaram no dia 8 de setembro, à noite. Do relato de Jurema, do dia 9, destaco:

“Não posso dizer que tivemos uma viagem maravilhosa, embora tudo corresse bem. Acontece que estávamos sob terrível tensão motivada pelo acidente de Zurich, do qual já falei, e, de chegada, tivemos um contratempo de não encontrar apartamento no Hotel Madeleine, onde devíamos ficar. Visto isso, toca a rodar outro tempão pela cidade - que é enorme - à procura de outro. e aqui estamos no Römischer Kaiser, lindo exemplar de alguns séculos atrás”... “A chuva é que está sendo um caso muito sério, pois não para nenhum minuto. Choveu desde que chegamos até este momento (18:00h). Enfim, não é novidade, porque faz tempo que não vemos sol nem sabemos o que é bom tempo. Assim mesmo, fizemos a costumeira excursão pela cidade, logo de manhã. Com a chuva, não deu para ver grande coisa, mas conhecemos o famoso Palácio Schönbrunn (nome que quer dizer Bela Fontana). É tão lindo que nem se pode descrever. rico com salas e salas, verdadeiras joias de arte e suntuosidade. É tanto ouro, tanto cristal, pinturas de artistas célebres, trabalhos fabulosos de arte chinesa, nem sei quanta coisa de valor incalculável. Para completar tanta beleza, lá está o jardim imenso, numa orgia de flores e verde a se perder de vista. Será outra lembrança preciosa que levo da Europa. Mas não falei ainda da cidade: muito grande, com os seus 1.700.000 habitantes, tem vida intensa, vibrante, dando bastante ideia de São Paulo, principalmente no movimento louco de veículos. A catedral de Santo Estevão também lembra a de São Paulo: estilo gótico, penso eu, um conjunto de verdadeiras maravilhas nos detalhes todos. A Ópera só vimos por fora, vamos ver se amanhã damos um jeito de visitá-la. Agora à tardinha, ao saímos para tomar um lanche, demos com a igreja de Santa Ana, quase de fronte ao hotel. Bem antiga, relativamente pequena, mas muito bonita. Imagens e quadros extraordinários, dourados em profusão. Na cidade, grande número de monumentos e fontes. A curiosidade de Viena é a enorme roda gigante, a maior do mundo, com vagões para 25 pessoas em vez dos costumeiros bancos; cada volta que ela dá dura 15 minutos. Neste momento são 21:30h. O rádio nos faz ouvir lindas músicas de Strauss. A Maninha acabou de se deitar, eu logo irei imitá-la. Só não sei se durmo tão cedo, porque estou preocupadíssima com a falta de notícias de casa. Nada mais recebi, desde o dia 30 de agosto em Amsterdam.”

De Viena, foram de trem para Veneza, porque a Alitalia estava em greve. Jurema apreciou muito a viagem:

“A viagem de trem de Viena para Veneza foi o que se pode chamar de maravilhosa. Paisagem de profundo encanto e um desenrolar de quadros lindos, os mais variados, não existindo, na minha opinião, superlativo que chegue. Vê-se de tudo: campos, bosques, aldeias, rios, lagos e montanhas, numa sucessão contínua. E, além de tudo, era praticamente o nosso primeiro dia inteiro de bom tempo depois que saímos de Paris. Trem bom. A chegada a Veneza coroou o dia, pois foi outro espetáculo empolgante. Aliás, não só a primeira impressão me empolgou.”

E se entusiasmou com Veneza:

“...O que Veneza tem de maior importância todo mundo sabe não é preciso enumerar. mas duvido que alguém possa fazer uma ideia exata sem ter visto assim, frente a frente. É tão forte a impressão, ao se sentir a alma de tanta beleza que a gente chora mesmo, de emoção. A praça de São Marcos à noite é um sonho de Mil e Uma Noites. Tudo iluminado feericamente, povo por toda a parte, e três orquestras ótimas tocando lindas músicas, uma em seguida à outra. E a impressionante majestade da igreja de São Marcos, ao fundo, completando o magnífico quadro.”

A etapa seguinte da viagem foi de trem, de Veneza a Florença.

“14 de setembro – Florença

Depois de longa, mas bonita viagem, aqui chegamos às 19:00h. O trajeto é interessantíssimo, por atravessar uma região bastante acidentada geograficamente. Em Ravenna almoçamos, fazendo depois um giro pela cidade que é antiquíssima. Na segunda parte da viagem, atravessamos grande zona montanhosa; creio serem os Apeninos”... “Bem, quero falar agora de Florença, neste dia caloroso que tivemos aqui. Cidade grande, mas não muito bonita assim à primeira vista. É preciso visitar seus fabulosos tesouros para se avaliar a importância do lugar. Vi pouca coisa, porque o tempo não deu mesmo, lamentavelmente. Serviu, apenas, para fazer uma ideia de como a arte impera aqui. Hotel bom, está satisfazendo, embora seja simples é acolhedor. Lili, filha de Ada, nos fez uma visita no fim da tarde. Simpática, foi um prazer conhecê-la. Veio com o filho Mário, menino alegre, muito dado. Amanhã tencionamos visitar a Ada em Viareggio.”

Ada era uma parente do Roberto, marido da Penha, que estivera antes em São Paulo, onde Jurema a conheceu. Jurema e Maninha, de Florença, foram visitá-la em Viareggio:

“...Nossa visita a Viareggio resultou num belo passeio, além do prazer de estar com a querida e simpática Ada.”... “Tempo bom, mas não tão firme; não impediu, entretanto, que déssemos longo passeio com a nossa anfitriã. Ela nos cumulou de atenções, tanto em sua casa - recanto bonito, acolhedor - como nos passeios e no almoço que nos ofereceu fora. Enfim, tivemos um dia diferente, recebendo carinho e convivendo com uma criatura assim tão boa.”

De Florença, foram para Roma, onde permaneceram de 15 a 20 de setembro. Destaquei do registro:

“16 de setembro – Roma

... “A vinda para Roma é um encanto de viagem, pena que estivesse fazendo tanto calor, impedindo que a gente a apreciasse melhor. Cidades ao longo da estrada, umas pequenas, mas outras bem interessantes e já maiores. almoçamos em Perugia, importante centro, capital da Umbria. Visitamos, mais tarde, o santuário de São Francisco, em Assis. Embora rapidamente, deu para apreciar o tesouro de beleza que há nas igrejas e, sobretudo, para sentir a atmosfera profundamente religiosa desse santo lugar. No mais, nada de tão importante para registrar.”... “Nosso hotel aqui, Pace Elvezia, compensou a ruindade de alguns: grande, bonito, e bastante confortável fica situado em parte muito linda de Roma. Estamos vizinhas da praça Venezia, onde se ergue o discutido monumento de Vítor Emanuel. Próximos desse monumento, há duas igrejas que devem ser bonitas e, também, colunas e ruínas, se não me engano do Fórum Romano (perguntarei a alguém para ficar sabendo). No mais, vou me deitar que não aguento mais de canseira.”

“17 de setembro – Roma

... “Dia ótimo, apesar de forte chuva que caiu de manhã e ,depois, novamente, um pouco à tarde e outro pouco agora à noite. Mas ninguém se queixou, porque só assim tivemos melhora na temperatura, que estava bem elevada. Estou gostando demais de Roma. Fizemos duas excursões pela cidade, vendo as maravilhas que permanecem nesta privilegiada cidade através dos séculos. Naturalmente, é uma visão rápida que se tem, mas já serve. O certo era passar-se pelo menos um mês, para ver isto de verdade. Tudo aqui é grandioso: construções lindas, ruínas impressionantes, estátuas maravilhosas, pinturas de artistas famosos, mármores, ouro, nem sei quantos tesouros, por todos os lados.”...

“19 de setembro – Roma

Ontem não pude escrever nada aqui, porque havia cartas para mandar, tarefas que terminei muito tarde. Foi, porém, o dia mais importante para mim, já que recebi a bênção do papa na basílica de São Pedro. Momento de profunda alegria foi esse. Além da forte impressão do acontecimento, ainda havia o tocante espetáculo daquele mundo de povo vindo de todas as partes, reunido ali naquele imponente, belíssimo Santuário. O entusiasmo, a vibrante manifestação de todos, cantando, dando vivas e batendo palmas, contribuiu para mais comover a gente. De maneira que estou dando graças a Deus por me conceder tão desejada oportunidade. E tudo o mais correu favoravelmente, pois tivemos boas notícias de casa, Maninha e eu.”

De Roma, voaram para Nápoles, cidade que Jurema apreciou bastante:

“Que espetáculo ver esta cidade de perto, ainda mais à noite! É simplesmente linda! Não só à parte a beira mar, que é realmente muito bonita, como principalmente o centro da cidade. Grande, de prédios imponentes, comércio vasto e fino e de movimento extraordinário. Para mim, foi surpresa, porque não a imaginava importante assim.”

De Nápoles foram para Capri, onde ela se extasiou:

... “Passeio lindíssimo, do qual guardarei grata lembrança. O dia ajudou muito, de sol e céu azul desde cedo, mas os lugares que vimos são mesmo de encantar. O mar é tão azul, naquelas bandas, que chega próximo do marinho; aliás, essa denominação deve vir exatamente deste mar. Viagem de duas horas, com ligeira parada em Sorrento, apenas para embarque e desembarque de passageiros. De chegada em Capri, fomos logo visitar a célebre Gruta Azul, beleza que não se descreve – é só vendo mesmo. De volta, tivemos o almoço em magnífico hotel, mas servido ao ar livre, na parte bem alta, já a caminho de Anacapri e com esplendida vista do mar. Em seguida, acabamos de subir até Anacapri, outro trecho de vista deslumbrante e lá nós paramos bem no alto, quase junto à casa de San Michele.”...

De Nápoles, ainda fizeram uma excursão para Pompeia, Amalfi e Sorrento. Destaco o que ela escreveu sobre a costa Amalfitana:

... “A estrada para Amalfi e Sorrento é de apaixonar qualquer um, tal a sua beleza. Mas, ai de quem tiver medo, porque ela circunda a montanha em quase toda a sua extensão e rente, sempre, a verdadeiros abismos de considerável altura sobre o mar. É espetacular, impressionante, como quase tudo aqui na Itália. Cidades e aldeias por todo o caminho; e sempre construídas sobre pedras, subindo para a montanha, como criaturas que fossem se acomodando, umas atrás das outras, em imensas arquibancadas, para assistir ao espetáculo daquele mar azul tão lindo.”

De Nápoles, voaram para o aeroporto de Roma, de onde partiram para Nice.

Nice foi a base de passeios delas para Mônaco, incluindo visita ao cassino de Monte Carlo. Chegaram a Nice debaixo de chuva. Com a palavra, Jurema:

“Viagem não tão boa como as outras, porque enfrentamos mau tempo e o avião jogou bastante. Mas, com a graça de Deus, aqui chegamos sãs e salvas. Descemos debaixo de chuva, vendo a cidade da maneira menos favorável. Em todo o caso, deu para perceber sua importância em tamanho e suas bonitas construções. Instaladas no Hotel de La Paix, muito bom por sinal, deitamos e dormimos, aproveitando a chuva. Ao nos levantarmos, o tempo já tinha melhorado e assim pudemos dar uma voltinha no fim da tarde.”

No dia seguinte, 23 de setembro, fizeram o tour de Nice pela manhã e foram para Mônaco à tarde, passeio que, em parte, Jurema descreveu assim:

... “Nem sei que adjetivos empregar para o passeio de hoje, pois parece que já usei e abusei daqueles que conheço. O caso é que a gente vê tanta coisa linda, dentro de pouco tempo, que acaba esgotando toda a inspiração. Porém, intimamente, o entusiasmo se renova sempre diante de tudo o que é belo. Esta excursão a Monte Carlo, então, dá a impressão de se estar tomando parte num desses filmes panorâmicos, onde aparecem esses lugares famosos. Para mim, o encanto era tamanho que mais parecia estar sonhando! Depois de passarmos por pequenos e grandes balneários, ao longo da costa, todos encantadores, eis que chegamos a Mônaco. A primeira parada foi no cassino e lá estávamos nós, de repente, naquele ambiente fabuloso, aliás bem conhecido através do cinema. É coisa de louco, pois, em plena tarde, o jogo já ia animadíssimo! Visitamos algumas salas, admirando a riqueza do ambiente. Muito movimento, tanto dentro como fora, ao redor do cassino e por toda a parte. De lá, fomos ao museu oceanográfico, passando pelo Palácio do Príncipe, interessantíssimo por ser um velho castelo, e vimos também a antiga catedral do principado, onde Grace e Renier se casaram.”... “De maneira que estamos fechando com chave de ouro nossa passagem pela França.”...

De Nice, rumaram para Barcelona, onde chegaram no dia 26 e de onde partiram para Lisboa com escala em Madri. Em Barcelona, tiveram parte do programa prejudicada, como conta Jurema:

... “Não pudemos fazer a costumeira excursão porque surgiu um contratempo com os passaportes, o que nos obrigou a ficar a maior parte da manhã de ontem – exatamente no horário do passeio – na chefatura de polícia. A encrenca foi pelo visto que trouxemos já ter caducado. Assim, toca a renovar tudo e, além do tempo perdido, mais 100 pesetas de despesa. Em compensação, fomos alvo das maiores gentilezas por parte da família Casado, a quem eu trouxe o presente que seus parentes de São Paulo mandaram. Foram incansáveis, proporcionando passeio de automóvel, visita e, por fim, nos ofereceram esplêndido jantar.”...

Chegaram a Lisboa na noite do dia 28, tendo voado em um Caravelle da TAP. Mesmo em fim de viagem, dizendo que estavam ansiosas para voltar para casa, ainda fizeram um bom programa em Portugal:

“Domingo 29, saímos logo cedo para a excursão a Fátima. Tempo lindo e bom, de maneira que a viagem resultou num grande prazer. Ao longo do caminho, sempre aldeias, cidades e paisagens bonitas para se ver. Parada em Santarém e, no fim de três horas, lá estávamos assistindo à missa e agradecendo à Virgem toda a proteção que nos tem concedido. Santuário bonito, tudo moderno e muita gente em peregrinação.”... “Depois do almoço em Fátima, seguimos até Tomar, onde existe um convento de grande importância histórica. Com nova parada em Santarém, onde nos foi servido lanche num estabelecimento típico, ouvimos música e assistimos a danças regionais do Ribatejo.”


Como eu disse no início da crônica, é inevitável a comparação dos recursos que têm os viajantes hoje em dia, turistas ou não. Naquele tempo, o sistema de reserva de hotéis era totalmente dependente de agências de turismo e sujeito a falhas. Mais de uma vez, as duas viajantes não puderam se hospedar no hotel que lhes havia sido reservado. Elas sofreram quase toda a viagem com a falta de notícias dos familiares – e estes, certamente, também, porque gostariam de saber delas. Hoje, as pessoas se comunicam o tempo todo por mensagens ou chamadas via telefone celular. Não era comum o conhecimento geral de mais de um idioma, tanto dos visitantes como das pessoas dos países visitados. Hoje, esse conhecimento é muito maior, de modo que a comunicação entre eles ficou mais fácil. Jurema e Maninha tiveram de se preocupar com a troca de dólar palas moedas locais em todos os países que visitaram. Hoje, teriam apenas de usar o Euro, que poderiam comprar aqui no Brasil.

Os equipamentos de transporte (aeronaves, ônibus, trens, barcos, automóveis etc.) que elas usaram evoluíram muito em rapidez, embora nem sempre em conforto.

Por outro lado, o atendimento pessoal que Jurema e Maninha tiveram por parte dos agentes de turismo foi fundamental e hoje custaria muito caro.

Um comentário final: minha mãe era católica, devota de São Judas Tadeu, passou a frequentar regularmente a igreja após ver os filhos criados, mas fiquei admirado quanto ela e Maninha viajaram a santuários, assistiram a missas, visitaram igrejas e, evento notável, receberam a benção papal no Vaticano. Certamente, tiveram proteção especial.


Jurema encerrou seu diário da viagem, em primeiro de outubro, com estas anotações:

... “Ontem, segunda-feira, movimentamo-nos desde muito cedo. Primeiro, fomos à missa, confessamos e comungamos. Em seguida, viemos tomar café e já saímos para providenciar as últimas comprinhas, trocar dinheiro etc. Eu, que tinha resolvido despachar pelo correio um pouco da roupa para desafogar a mala, tratei logo de arrumar tudo para que desse tempo de a remessa ser feita ainda ontem. Resolvido esse assunto, ainda restava me preparar para não assustar os meus na chegada, tal o desarranjo de cabelo, unhas e por cima o estado de abatimento, aliás muito natural depois de tão grande correria. O resto da tarde e começo da noite empregamos na arrumação da bagagem. Nada mais havendo a tratar, resolvemos ir jantar num restaurante típico chamado “Folclore”, que fica próximo do hotel, nesta parte antiga de Lisboa, chamada a Alfama. Gostamos demais porque, além de magnífico jantar servido, ainda assistimos ao espetáculo mais bonito que se possa imaginar em matéria de folclore autêntico. Tudo rico, gente bonita e boa música.

E vou encerrando. porque está quase na hora de sairmos para o aeroporto.”

Washington Luiz Bastos Conceição


Nota:

Prezada leitora ou caro leitor:

As anotações de Jurema nesta viagem dariam um pequeno livro de 40 páginas no formato seis por nove polegadas. Estou pensando em fazer uma publicação das anotações das três viagens do livro, o que daria um livro impresso de cerca de cem páginas. É uma boa ideia?