Um de meus filhos, no mesmo dia, enviou ao grupo
da família um áudio de Manzanero interpretando “Esta tarde vi llover”, talvez a
mais famosa de suas canções. Lá em casa, todos conheciam o cantor e suas
músicas, pois seus discos frequentavam bastante nosso aparelho de som (o que
acontece até hoje), passando de long-playings para CD’s, desde minha primeira
viagem ao México.
Meus
leitores já sabem que gosto muito das canções e boleros mexicanos. No ano
passado, em abril, publiquei a crônica “Boleros – Poesia e Romance”,
complementando-a com uma lista de links do Youtube correspondentes a músicas
selecionadas para ilustrar a crônica; assim, os interessados puderam apreciá-las,
distraindo-se durante o isolamento social imposto pela pandemia.
Mencionei
vários autores e boleros que embalaram minha juventude. Leilah e eu dançávamos
ao som da música e namorávamos inspirados por sua poesia. Depois de casados, os
boleros sempre estiveram em nossa discoteca, especialmente aqueles que se
tornaram clássicos, e continuaram a fazer parte do cardápio de nossos programas
musicais domésticos.
Como já
comentei em meus escritos, na década de 1960 o bolero foi aos poucos perdendo
força no Brasil, com o sucesso da bossa nova, da jovem guarda, de novas danças
como o “rock and roll”, de forma que passou a ser uma música dos mais velhos.
O México
teve sempre minha simpatia. Por sua música, por sua história tão rica e, também,
pelo bom relacionamento que tive com os mexicanos que conheci. E, não devo
esquecer, Cantinflas e seus filmes também reforçaram esse sentimento.
Em 1967,
então gerente do centro de treinamento para clientes da IBM, em São Paulo, fui
designado para assistir a um curso em Cuernavaca, cidade turística próxima à
capital mexicana, onde a IBM tinha um centro de treinamento para executivos.
Foi minha primeira viagem ao México.
Concluído
o curso em Cuernavaca, fui à cidade do México onde, na semana seguinte, eu
cumpriria um programa de reuniões de trabalho na matriz mexicana da IBM. Tive,
portanto, no fim de semana, a oportunidade de fazer um pouco de turismo e,
modéstia à parte, aproveitei-a muito bem. Devidamente orientado pelos amigos
mexicanos, aluguei um fusca e rodei bastante pela cidade. Minhas principais
visitas foram: na praça principal (El Zócalo), ao Palácio Nacional, onde pude
apreciar os murais de Diego Rivera, e à Catedral Metropolitana; no parque de
Chapultepec, ao Museu Nacional de Antropologia.
Fora da
cidade, fui conhecer as pirâmides de Teotihuacan.
E mais, assisti,
no Palácio de Belas Artes, ao belíssimo espetáculo do Balé Folclórico do
México.
À medida
que eu admirava tudo o que via, eu dizia com meus botões: “Leilah devia estar
aqui comigo – é o tipo de programa que ela, com sua formação artística de arquitetura,
iria ficar encantada”. Com esse estado de espírito, ouvi, no rádio do
automóvel, mais de uma vez, uma canção romântica muito bonita, com uma
interpretação diferente e personalíssima de um cantor de quem eu nunca tinha
ouvido falar. A canção era “Adoro”, com versos assim:
...
“Adoro
la forma en que sonríes
Y el modo en que a veces me riñes
Adoro la seda de tus manos
Los besos que nos damos, los adoro,
vida mía
Y me muero por tenerte junto a mí
Cerca, muy cerca de mí, no
separarme de ti
Y es que eres mi existencia, mi
sentir
Eres mi Luna eres mi Sol, eres mi
noche de amor”
…
Durante a
semana, procurei um disco que contivesse aquela música e encontrei o “long-play”
“A mi amor... Con mi amor”. Era
um sucesso de Armando Manzanero, compositor e cantor, retratado na capa do
disco à frente de seu piano.
Está em minha discoteca de long-plays até hoje. |
Do México
ainda fui a Nova York antes de voltar ao Rio, mas o disco viajou bem e tive a
satisfação de, ao chegar em casa, tocá-lo para a família. A grande e
agradabilíssima surpresa foi constatar que “Adoro” vinha muito bem acompanhada
no disco – todas suas músicas são muito boas, de tal forma que algumas ganharam
mais destaque do que a primeira. Estão nele, por exemplo, “Esta tarde vi
llover”, “Contigo aprendi”, “Aquel señor” e “Perdóname”.
Depois de
algum tempo, no Brasil, achei o “Para mi siempre amor”, outro long-play com
músicas muito boas, como “Eres tu”, “Pero te extraño” e “Ya te olvidé”, por
exemplo. O terceiro foi “Corazón Salvage”, com músicas da novela com o mesmo
título.
Nesse tempo,
como hobby de fim de semana, eu gravava em fitas cassete programas de músicas populares
variadas (que eu chamava “a melhor música que tenho em casa”) e sempre
introduzia algo de Manzanero.
Quando os
sistemas de som passaram à fase dos CD’s, encontrei boleros e canções de
Manzanero interpretadas, também, por outros cantores e inseridos em discos com
músicas de autores variados.
Meus
long-plays ficaram encostados, mas não me desfiz do antigo sistema de
toca-discos de long-play. Demorou, mas um técnico nissei conseguiu ligá-lo ao
meu novo aparelho de som (este, aliás, já está idoso) e voltei a ouvir meus
long-plays.
Antiguidade em funcionamento |
O
noticiário da morte de Manzanero, acompanhado de resumos biográficos, me fez
constatar que, nos últimos anos, eu não vinha acompanhando suas atividades e o
reconhecimento internacional de sua obra. Por exemplo, eu não sabia do prêmio
Grammy que ele recebeu em 2014; do sucesso de “Somos Novios”; de seu show com
Plácido Domingo; de outro, com Roberto Carlos; e da interpretação de suas
músicas por cantores famosos – como Pavarotti e Andrea Bocelli. Li, agora,
também, que Gabriel García Márquez considerava Manzanero um dos grandes poetas
da língua espanhola.
De minha
parte, posso dizer que sua poesia nas letras das músicas me encanta por seu extraordinário
romantismo, sua originalidade e sua intensidade. Para ilustrar o que estou
tentando expressar, transcrevo abaixo alguns versos de “Contigo Aprendí”:
Que existen nuevas y mejores emociones
Contigo aprendí
A conocer un mundo nuevo de ilusiones
…
“Aprendí
Que puede un beso ser más dulce y más profundo
Que puedo irme mañana mismo de este mundo
Las cosas buenas, ya contigo las viví
Y contigo aprendí
Que yo nací el día en que te conocí”
Manzanero permanece conosco. Desejo que ele tenha tido meios de saber quanto encantou pessoas do mundo todo com sua música, seu piano e sua poesia. Que o “chaparrito” genial descanse em paz.
Washington Luiz Bastos Conceição
Notas:
- Na volta da temporada de nossa família em Chicago, em 1969, tiramos uns dias de férias e passamos pelo México, Leilah, eu e os três meninos (ainda não tínhamos a caçula). Fizemos o mesmo programa turístico que cumpri em 1967. Depois, ao longo dos anos, tivemos oportunidades de voltar àquele país – e as aproveitamos muito bem.
- Para os leitores interessados em ouvir músicas
de Manzanero, informo que o Youtube oferece um extenso cardápio delas. Para
começarem, passo abaixo os links de áudios de “Adoro” e de “Contigo aprendí”:
https://www.youtube.com/watch?v=Gb7C9rga3wc
https://www.youtube.com/watch?v=7v4OIim8LBw
Adoro Esta tarde vi llover...
ResponderExcluirDe Álvaro Esteves: Excelente, caro amigo! Boleros em desfile! E bela e merecida homenagem!
ResponderExcluirDe D. Isette: Washington, como uma grande apreciadora de Boleros,achei perfeita a sua crônica homenageando Manzanero!!! Esse ritmo que embalou nossa geração, não pode ser esquecido! Abraços para vocês.
ResponderExcluir