sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Minha breve história dos computadores - Primeira parte: Comparações.


Mais de uma vez, recebi de amigos, por e-mail, apresentações sobre a evolução dos instrumentos de cálculo. Em geral, vêm em quadros de Powerpoint com figuras e fotos de máquinas de calcular de várias épocas, chegando até os computadores e a internet.

Outro dia, minha prima Isa (que enriqueceu meu blog com alguns de seus escritos) enviou uma dessas apresentações a um grupo nosso, de parentes, comentando:
“Imagino que o Washington conheça tudo isso  "ao vivo e em cores", mas acho que vale a pena recordar os tempos passados, não tão velhos, mas parecendo da pré-história... Abrs.”
Outro primo acrescentou:
“Interessantíssimo, Isa... Eu não conhecia essa ótima resenha histórica, que bem merecia uma crônica do Washington, conhecedor profundo do assunto. E aí, primo, que tal a ideia?”

“Conhecedor profundo” é exagero do primo. Porém, realmente, por força de minhas atividades na IBM, estudei os computadores eletrônicos (ou seja, os “sistemas eletrônicos de processamento de dados”) e suas aplicações; trabalhei muito na divulgação dos mesmos, desde o tempo em que eles eram uma novidade um tanto misteriosa, de ficção científica, e, por esta razão, apelidados “cérebros eletrônicos”.

Atualmente, são instrumentos de trabalho utilizados nas mais variadas áreas de atividades; ligados à internet, alcançam o mundo todo. Com a evolução da telefonia celular, de uma forma ainda mais intensa.

As aplicações dos computadores se estenderam rapidamente desde a área de cálculo e escrita, onde permitiu o aperfeiçoamento da administração de todas as organizações, empresas e governos, até as áreas de imagem e de som, facilitando enormemente os trabalhos gráficos e musicais. Assim, a tecnologia da informação passou a servir também às artes. Nas atividades científicas, ligados a aparelhos especiais, os computadores estão sendo fundamentais para novas pesquisas, estatísticas e simulações.


Pensando nessa evolução, tão rápida, dos computadores eletrônicos digitais (no Brasil, começaram a ser utilizados no fim da década de 1950), pareceu-me oportuno, atendendo à sugestão do primo,  comentar as etapas dessa evolução.
Começo, nesta primeira parte da história, comparando os recursos que temos hoje com os instrumentos de trabalho utilizados na época em que eu era estudante de Engenharia em São Paulo.


Mediante a utilização de computadores eletrônicos há, hoje, para cálculos os mais variados, programas aplicativos específicos; para cálculos em geral, planilhas eletrônicas com recursos cada vez mais avançados. Para projetos de Engenharia e Arquitetura, software do tipo CAD (Computer Assisted Design) e outros específicos (para cálculo de estruturas, por exemplo). Para artes gráficas, o “Corel Draw” é muito utilizado. Para trabalho com imagens, os de uso geral e aqueles especiais para diagnósticos médicos. Para a escrita, os processadores de textos, com grande variedade de formatação e de fontes, mais correção ortográfica e recursos avançados, os quais só descobrimos quando aparece uma necessidade nova.
Com o advento e a evolução da internet, então, os recursos de que dispomos para as mais variadas atividades se aproximam do infinito.


Quais eram, na minha época de estudante, os instrumentos de que dispúnhamos e que foram desenvolvidos por cabeças brilhantes, durante anos e anos?

Para cálculos, tínhamos a régua de cálculo, com a qual alguns colegas já tinham contato desde o colégio, as máquinas mecânicas de calcular tipo “Brunsviga”, as máquinas de somar e, especialmente no caso dos nisseis, o soroban.

A régua de cálculo era bastante usada para cálculos rápidos que não exigissem grande precisão. A de pequeno tamanho era ostentada, como uma espécie de distintivo de estudante de engenharia, no bolso superior do paletó, junto à lapela (pois é, usávamos paletó na escola); as réguas maiores, de precisão mais alta, eram usadas sobre a mesa.

Usada para multiplicações e divisões, não deixa de ser um ábaco. Consiste em duas réguas com escalas logarítmicas e um cursor. O cálculo é feito deslizando-se a régua interna e o cursor, posicionando-os de acordo com os números dados. Na multiplicação, o que se está fazendo é somar logaritmos dos fatores para obter o logaritmo do produto, ou seja, está sendo aplicada a fórmula:
log(AxB) = logA + logB.

O cuidado que se deve ter com a régua é quanto à precisão (2x2 pode resultar 3,9) e, principalmente, quanto à ordem de grandeza, pois a operação de 2x3 (=6) é a mesma de 2x30 (=60).

Abaixo, minha régua grande, de mesa, que guardo em meu micromuseu de tecnologia (este ocupa três prateleiras da estante da saleta do apartamento).


Fabricada na Dinamarca, marca Diwa, ela foi comprada com certo sacrifício. Em seu estojo, traz algumas instruções impressas em Francês sobre como cuidar dela, que terminam com a frase: “Se você tratar bem da régua de cálculo Diwa, ela permanecerá sua amiga para a vida inteira.” Tratei bem dela, agora conservada como relíquia, de modo que continua minha amiga.

A máquina de calcular mecânica de mesa (“desk top”, portanto), do tipo “Brunsviga”, era essencial para cálculos de grandes números, como nos trabalhos de Topografia, por exemplo. Neste caso, a precisão exigida era muito grande e os números eram muitos. A máquina calculava mediante engrenagens e era operada mediante manivela e teclas de posicionamento. Cansava o braço.
Usada em empresas, era cara para a maioria dos estudantes, de modo que utilizávamos as máquinas da Escola (a Politécnica) nos respectivos departamentos. 

Abaixo, a foto de uma “Brunsviga”.
Fonte: Site retrocalculators,com
O aperfeiçoamento neste tipo de máquina foi torná-las elétricas, de modo que sua operação deixou de ser braçal.

Aprendi a usar o soroban na matéria Estatística, na Escola, juntamente com outros tipos de ábaco.
Abaixo, foto de meu soroban, também exposto no meu micromuseu.

Soroban com 21 casas
Eu não o utilizava nos trabalhos, mas achava, e ainda acho, muito interessante a solução de operar por deslocamento as quatro rodinhas de baixo (1 a 4) e a única de cima (5) para representar algarismos de 1 a 9 e fazer os “vai-um” por posicionamento à esquerda (unidades, dezenas, centenas, etc.).

Ao lado, em detalhe, o número 182 registrado nas três casas amarelas centrais.
Meus colegas nisseis contavam a história de um concurso de velocidade e precisão de cálculo entre operadores de máquina de calcular elétrica e de soroban, vencido pelo japonês do soroban. Nunca soube onde foi esse concurso, nem quando; como sempre me dei bem com os nisseis, acreditei. Com o advento dos computadores, as competições foram diferentes: os enxadristas enfrentaram computadores eletrônicos.
Quanto a desenhos (nem só com cálculos lidava o estudante de Engenharia) havia, principalmente, trabalhos de Geometria Descritiva – épuras fabulosas – com exigência de grande precisão, para um professor altamente caprichoso e exigente.
Sobre uma prancheta, escala, lápis, esquadro e régua "T".
Os instrumentos de trabalho que tínhamos eram a régua “T”, prancheta, esquadros, compasso, transferidor, escalas, tira-linhas, normógrafos e, não esqueçamos, lápis com grafite apropriada, preto e de cor.
Em particular, o normógrafo, usado para a colocação dos títulos e letreiros nos desenhos, era muito importante para a apresentação dos trabalhos.

Vou encerrar esta crônica comparando o que tive de fazer para escrever e publicar esta crônica, usando meus recursos atuais, com o trabalho que eu teria para publicá-la com os recursos disponíveis naqueles velhos tempos:
Normógrafo em seu estojo
Normógrafo em operação
Digitei o texto em meu computador, usando o Word. A seguir, fiz a revisão do texto, completei a formatação e, no final, passei o corretor ortográfico.
Para as ilustrações, fotografei os objetos com a câmera digital e transferi as fotos para meu computador. A exceção foi a foto da Brunsviga, que copiei do site mencionado. Selecionei as fotos e as editei, ou seja, procurei melhorar a iluminação e as cores.
Estojo com compasso e tira-linhas

O passo seguinte foi entrar na internet e abrir meu blog. Abri uma nova postagem e copiei o texto do Word para o blog. Neste, inseri as fotos, trazendo-as do computador. Acertei a formatação, fiz a última revisão e, a seguir, vou publicá-la.

Após a publicação, enviarei e-mails para os amigos, anunciando-a.

No meu tempo de estudante, eu teria de cumprir as seguintes tarefas: preparar o manuscrito, pedir para alguma alma caridosa datilografar para mim, fazer a revisão do texto e mandar copiar o texto em um mimeógrafo, o que iria requerer a datilografia final em papel estêncil e uma operação manual de manivela para cada cópia. Naquele tempo não havia copiadoras tipo “Xerox”, nem mesmo a terrível termofax, e fotocópias eram caríssimas, somente se usavam para documentos.

Obtidas as cópias, eu teria de colocá-las em envelopes, endereçá-los a cada um dos amigos, ir à agência do correio mais próxima (ou menos longe de casa), selar os envelopes, inseri-los nas caixas correspondentes e rezar para os envelopes chegarem ao destino – não havia nem CEP!
Para juntar fotos, eu teria de fotografar os objetos com uma câmera com filme, mandar revelar e fazer as cópias necessárias – e as fotos seriam em branco e preto.

Depois, para saber se alguns amigos tinham recebido, eu tinha de recorrer ao telefone, operação também muito complicada naquele tempo.

Você, prezada leitora ou caro leitor, há de convir que hoje as coisas estão muito mais fáceis.


Na continuação desta crônica, contarei a minha história dos computadores, cuja evolução venho acompanhando durante todos estes anos. Agora, com a ajuda de meus netos.

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Washington Luiz Bastos Conceição

7 comentários:

  1. Que beleza de texto, especialmente quando você compara o trabalho de divulgá-lo no blog e como seria há (não muitos) anos. Bastante didático para a nova geração. E pensar que a gente ainda reclama quando o computador demora mais do que 2 segundos para nos responder a um comando...
    Não cheguei a utilizar a régua de cálculo, embora meu pai tenha me ensinado como fazê-lo, mas, desnaturadamente, não me lembro mais. Em todo caso, guardo com carinho uma régua grande que foi "amiga" do meu velho. Trata-se de uma Keuffel & Esser.
    Aguardo a continuação. Grande abraço!

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    1. Caro Edison Junior:
      Lembro-me de que seu pai, nos tempos do colégio, já usaca o normógrafo para fazer as capas dos exercícios de Matemática do Professor Alves Cruz.
      Obrigado pela leitura e pelo comentário. .

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    2. Editando o comentário acima: substituir usaca por usava. Digitação não é o meu forte.

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  2. Devo dizer, para constar, que a minha régua de cálculo era uma Aristo Trilog, e que o primeiro computador com o qual trabalhei era um IBM 1130 de 8K de memória. Um espanto.

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  3. Caro Gentil:
    A sua Aristo devia ser mais sofisticada do que a minha amiga DIWA. E o 1130, contemporâneo do 360, já era o sucessor de outro computador IBM projetado para aplicações técnicas e científicas: o 1620, contemporâneo do 1401. Mas vou tratar da evolução dos computadores na segunda parte desta história.Nào perca!
    Obrigado pela atenção.

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  4. Muito bom! No aguardo da segunda parte! Me lembro de querer brincar com a Soroban!

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  5. Jurema:
    A segunda parte está quase pronta.
    Obrigado pelo comentário.

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