Acontece com
frequência: quando algo novo é anunciado no País, quando uma lei é promulgada
ou o governo cria uma nova medida regulatória, e essa novidade me desagrada,
comento em casa e com os amigos. Não demora muito e o Ubaldo (João Ubaldo
Ribeiro, claro!) publica uma crônica a respeito. Ele reage da mesma forma que
eu – só que escrevendo muito bem, no seu estilo irônico, mordaz. Abordou
assuntos como a atuação dos seguros médicos, a criação de uma nova tomada de
eletricidade que só existe no Brasil e é de uso obrigatório, a reforma
ortográfica... E por aí vai.
Um domingo, o Ubaldo publicou uma crônica
intitulada “Cobertura Moderna”. Ao ler o título, imaginei que o assunto fosse
apartamentos de cobertura, porém, para minha surpresa, ele escrevia sobre as
narrações de jogos de futebol. Criticava a quantidade de informações inseridas
pelo locutor, que não lhe interessavam, enquanto ele tentava apreciar o jogo.
Mais uma vez, criticou, de forma magistral, algo de que eu já vinha reclamando
bastante. Já faz algum tempo que penso em apresentar meus comentários sobre o
assunto; é o que estou fazendo hoje.
Não sou, até onde posso observar, um telespectador
brasileiro típico, nem mesmo considerando minha condição de idoso e aposentado.
Assinante de serviços de rede, tenho acesso a uma grande variedade de canais,
mas habitualmente assisto apenas a filmes, a partidas de futebol, a algum
noticiário e a algumas entrevistas. Ainda assim, muito seletivamente. Em
especial, não tenho o hábito de assistir a novelas e a programas de auditório.
Pois, nos últimos tempos, ao assistir a um jogo de
futebol pela televisão, sinto que o narrador faz tudo para tirar a atenção do
espectador do jogo propriamente dito. Ele introduz observações e anúncios que
poderiam ser feitos no intervalo da transmissão ou em resenhas esportivas ou, ainda, em outros
intervalos de programação da emissora. A consequência é que o espectador se
desconcentra e até perde algumas jogadas ou fica sem saber que jogadores
participaram delas. As observações impertinentes variam. Nos canais abertos,
anúncios de outros programas da emissora (o “domingão”, a transmissão das
“ultimate fights”, de corridas da Fómula 1 e de “stock cars”, dos jogos do meio
da semana, etc.) e, pior ainda, na volúpia de se fazer interativa, a emissora
apresenta mensagens e até vídeos de torcedores cujas observações são
perfeitamente dispensáveis durante a transmissão do jogo – e algumas vezes até
idiotas – enquanto o jogo rola e o telespectador quer acompanhar as jogadas.
Nos canais da rede por assinatura, o narrador ou o comentarista insiste em
apresentar estatísticas que poderiam muito bem ser divulgadas em resenhas em
separado; estas estatísticas também perturbam quem realmente quer acompanhar a
partida que está se desenrolando naquele momento. Por exemplo: “Faz doze anos
que o time A não perde para o time B em casa” ou “O time A foi campeão pela
última vez em 1988”, repetidas várias vezes durante a narração. Houve um caso,
até pitoresco, com um conhecido comentarista que morou na Itália e é um
profissional da culinária (com quem, aliás, eu simpatizo muito): por causa da
interação com telespectadores, um destes lhe perguntou onde, na Itália, se come
a melhor pizza; ele respondeu, com minúcias, justificando sua avaliação,
enquanto o jogo corria e os outros telespectadores interessados no futebol,
como eu, queriam era assistir à partida sem maiores divagações.
Para me entenderem bem, reforço que não sou contra
as informações e a interação com telespectadores, desde que não seja durante a
partida. Algumas poderiam ser feitas no intervalo e no final, talvez no tempo que
hoje é destinado àquelas entrevistas repetitivas e desinteressantes de
jogadores selecionados pelos repórteres de campo, jogadores que agora estão
treinados com um script para não criarem problemas com alguma observação
imprópria que poderia ter consequência desastrosa. Vejo, entretanto, como
melhor solução para o problema, deixarem para fazer todos os comentários sobre
os jogos durante as resenhas esportivas, já apresentadas por várias emissoras.
Alguns desses programas são bem interessantes, especialmente um deles, que
reúne entrevistas, comentários, vídeos e um pouco de música.
Tento entender por que razão as transmissões de
futebol chegaram a esse formato. É evidente que este é fortemente influenciado
pela tecnologia dos meios de comunicação (interação com telespectadores) e da
informação (disponibilidade instantânea de dados), mas vejo também outra
influência: os narradores são profissionais de jornalismo e alguns não devem
apreciar o futebol do jeito que eu o faço. O que me chamou a atenção para este
aspecto foi o próprio slogan de duas das emissoras: “A informação é o nosso
esporte”. Pois é, aí está nossa diferença: o esporte deles é a informação e o
meu é o futebol, que pratiquei na infância e na juventude.
A informação não é o meu esporte.
Enquanto as emissoras não fazem por melhorar minha
vida de telespectador de futebol, vou me defendendo: quando o narrador me
aborrece, por falar demais durante o jogo ou por fazer os comentários que expus
acima, desligo o som da televisão e aproveito com total tranquilidade as
imagens que, hoje em dia, são ótimas. Se vocês, caros leitores, se sentem como
eu ao assistir a um jogo pela televisão, experimentem esta solução.
Washington Luiz Bastos Conceição