domingo, 29 de junho de 2025

D. Izaura e sua gente – Apresentando as pessoas - 1

Cara leitora ou prezado leitor:

Esta é a quinta crônica da série “D. Izaura e sua gente”, na qual conto como conheci e me relacionei com as pessoas da família dela. Como nas outras crônicas, escrevo com base nas lembranças que tenho delas, com o melhor esforço de memória e recorrendo aos meus caros colaboradores.


Lembrando: corria o ano de 1948.

Não posso me lembrar, claro, de como fui apresentado a cada um dos membros da família, mas certamente eu os conheci primeiro na hora do almoço, nas tardes em que ia estudar com o Sérgio na casa deles. D. Izaura, Seu Corrêa (o vô Juca), D. Yolanda, mãe do Sérgio, D. Glória e o Doutor foram, certamente, as primeiras pessoas. Outros, que tinham expediente a partir do meio-dia, almoçavam mais cedo, como D. Olga, por exemplo, conheci quando passei a ficar até mais tarde e, na época de provas, até dormia lá.

Como lembrete, insiro abaixo o quadro dos filhos e cônjuges de D. Izaura e o Vô Juca.


O Doutor e Nazaré

O Doutor Zeca vinha de seu trabalho da manhã na diretoria do Hospital da Cruz Vermelha,  para almoçar e fazer uma injeção em sua mãe; entendi que era diária, mas nunca perguntei qual o tratamento, apenas fiquei sabendo, mais tarde, que ela tinha extraído um dos rins. Filho mais velho de D. Izaura, estava em forma aos 46 anos. De altura média, talvez um metro e setenta, pele e cabelos claros, era discreto, bem-humorado e respeitado pelos irmãos e cunhados. Quando ele se despedia depois do almoço, costumava dizer: “Vocês já ganharam a vida, mas eu tenho, ainda, de trabalhar”.

 

O doutor, no descanso do fim de semana

Ainda solteiro, morava no sobrado, dividindo um quarto bem espaçoso com o irmão Gentil. Tinha certas regalias: seu escritório, onde o Sérgio e eu estudávamos, era amplo e mobiliado com uma grande escrivaninha, estantes com seus livros, poltronas e um sofá. Na geladeira, de uso comunitário, que eu conheci apenas ao buscar água, o Sérgio me explicou que a garrafa de leite tipo A (o especial daquele tempo) era “o leite do Doutor”. No fim do dia, guardava o automóvel no corredor externo da casa.

Era noivo da Nazaré (nestes dias, fiquei sabendo que seu nome de solteira era Purcina Nazareth Ferreira Alves), com quem viria a se casar no ano seguinte (1949). Ela era uma moça educada, professora aposentada, de família de fazendeiros de Itapira, cidade do interior do estado de São Paulo, próxima à capital, Era mais moça que o Doutor. Elegante, cerca de 1,60 de altura (mais salto alto), de pele clara e cabelos escuros; moderadamente expansiva, formava um par simpático com o “José Maurício”, como costumava chamar o Doutor. Eu a conheci nas visitas e festinhas da família que faziam no sobrado; ao dançar o casal fazia um belo par.

Quando se casaram, moraram algum tempo no sobrado, enquanto estava sendo finalizada a construção de sua casa na Rua Bento de Andrade, próxima ao Parque Ibirapuera. Ocuparam o grande quarto da frente. O quarto do Gentil passou a ser a antiga sala extra de refeições e o Sérgio foi fazer companhia ao tio, descendo do pequeno quarto que tinha em cima (este passou a ser usado por mim, quando precisava dormir lá).

Nova personagem na casa  de Izaura e tudo bem.


 D. Yolanda e Dr. Lauro

D. Yolanda, mãe do Sérgio, era professora, dava aulas no Grupo Escolar Campos Salles, cujo prédio ficava no mesmo terreno do prédio do Colégio Presidente Roosevelt, onde Sérgio e eu estudávamos, à rua Conde de São Joaquim. O Grupo, na frente do terreno e o Colégio, nos fundos. Tenho lembrança de tê-la encontrado a primeira vez na entrada do Grupo Escolar. Atenciosa, simpática, tinha pele, olhos e cabelos claros, cerca de 1,60 de altura, nem gorda nem magra. Chegando aos 40 anos, era a mais velha das irmãs.

Aparentemente, como trabalhava fora, suas tarefas domésticas se limitavam aos seus aposentos. Uma tarde por semana frequentava uma roda de pif-paf, carteado muito popular naquele tempo, na casa de uma amiga. Alguns sábados, como a amizade se estendia aos casais, acompanhava o marido à roda que incluía os homens.

Foi uma das pessoas mais “cucas frescas” que conheci na vida. Seu relacionamento com seu marido, era normal, ambos dedicados ao filho único. Certamente orientou o menino durante seu curso primário, cabendo ao pai o apoio aos estudos mais avançados do rapaz.

Dr. Lauro Bastos, marido de D.Yolanda e pai do Sérgio, não era parente de meu pai; sua família era do interior de São Paulo e minha avó paterna, Balbina Bastos Conceição, era de Paranaguá, no Paraná. Dr. Lauro era alto, cerca de 1,75m, forte, pele clara, cabelo grisalho, liso; jeito expansivo, mostrava forte personalidade. Gentil e amistoso, sempre me tratou muito bem. Depois da algum tempo, percebendo que Sérgio e eu evoluímos de colegas para uma grande amizade, parece-me que viu em mim um irmão postiço do filho que ele adorava. Advogado, usava um Português perfeito, tinha um vocabulário rico, que incluía palavras “difíceis” que eu desconhecia (lembro-me de “prolegômenos” por exemplo). Transmitiu esse refinamento ao Sérgio. Diferente dos brasileiros de sua geração, cujo conhecimento de língua estrangeira era o Francês, conhecia Inglês. Lembro de que, observando uma conversa que eu estava tendo com o Armando (seu cunhado), comentou com o Sérgio “He speakes well!”.

O casamento de Yolanda e Lauro

Um dia, depois de meses de minha entrada na casa, vi na parede do quarto do Dr. Lauro um quadro de fotografias de sua formatura – era igual àquele que meu pai tinha em casa. Lá estavam as fotos de Lauro Bastos e Osmar Bastos Conceição. Eles foram colegas de turma na Faculdade de Direito! Comentei com meu pai, que me disse que, sendo uma turma grande, eles se conheciam só de vista; ambos mais velhos que os colegas em geral, casados, pais de família, já trabalhavam – meu pai no IAPI e Dr. Lauro no Banco do Brasil. Não tinham tempo de socializar com os colegas.

Ao longo de minha convivência com a família, guardo do Dr. Lauro a lembrança de sua extraordinária generosidade no trato com as pessoas em geral.

Washington Luiz Bastos Conceição


Notas:

A. Naquele tempo, o Hospital da Cruz Vermelha era pediátrico, tendo sido fundado em 1917. 

B. Cara leitora ou prezado leitor:

Para ler as quatro primeiras crônicas da série, clique nos links abaixo:

1) D. Izaura e sua gente – Introdução

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/02/d-izaura-e-sua-gente-introducao.html

2) D. Izaura e sua gente – A casa e os moradores

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/03/d-izaura-e-sua-gente-casa-e-os-moradores.html

3) D. Izaura e sua gente – Leilah na Galvão Bueno

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/04/d-izaura-e-sua-gente-leilah-na-galvao.html  

4) D. Izaura e sua gente – Vovò Juca

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2025/05/d-izaura-e-sua-gente-vovo-juca.html

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