1968 foi um ano marcante na História recente, no
mundo todo. Os jornais e a televisão nos fazem lembrar dos importantes acontecimentos
políticos e sociais daquele ano: no Brasil, destaque para o Ato Institucional
Número 5, que endureceu a ditadura militar; na Europa, o movimento estudantil
em Paris que resultou em conflitos sérios e, em Praga, a tentativa frustrada de
mudança de regime de governo; nos Estados Unidos, o assassinato de Martim
Luther King e de Robert Kennedy e a eleição de Nixon para a presidência.
Em 2018, portanto, esses vários eventos, cujo
noticiário acompanhei intensamente, completam seus cinquentenários.
Particularmente, 1968 foi, para mim
e minha família, o ano do início de nossa maior aventura, cuja história conto em meu
livro “O Projeto 3.7 e Nós”. Na apresentação deste, escrevi:
“Eu tinha
trinta e cinco anos, já era casado e tinha três filhos. Morávamos em São Paulo
e eu trabalhava na IBM. A expectativa de nossa família era que eu fizesse
carreira na Empresa, permanecendo em São Paulo, embora houvesse a possibilidade
de mudança temporária para outro estado ou, menos provável, para o exterior.
Contudo, naquele ano (1968), fui
designado para um projeto internacional da Empresa em Chicago, Illinois,
Estados Unidos. Ao nos mudarmos para lá, iniciou-se uma temporada muito
especial em nossa vida, de cerca de um ano e meio naquele país, a qual viria a
influenciar profundamente o destino de nossa família. Tornou-se nosso ponto de
inflexão na vida, nosso “turning point”. Ela foi a razão fundamental de termos
tomado, mais tarde, caminhos diferentes.
As
lembranças que tenho de nossa aventura em Chicago, das experiências em terra
estranha de um casal jovem com três filhos pequenos, vêm em forma de causos
encadeados, abrangendo meu trabalho com colegas das mais variadas
nacionalidades e, principalmente, a vida de minha família e o convívio com os
amigos que fizemos lá.”
Penso muito nesse “turning point”, nas
consequências dessa temporada nos Estados Unidos para a vida de minha família.
Em primeiro lugar, já na volta ao Brasil, tivemos a
mudança para o Rio de Janeiro em 1970 – um impacto nas grandes famílias (a
minha e a da Leilah). As perguntas mais frequentes que os parentes e amigos nos
faziam eram: “Quanto tempo vocês vão ficar lá?”; ou, mostrando uma preocupação
maior: “Vocês vão voltar para São Paulo?”. Para os paulistanos em geral, o Rio
era uma cidade ótima para visitar, mas, para morar, São Paulo era muito melhor.
Outra consequência importante foi a orientação do desenvolvimento
da família para a globalização, mantida por minhas atividades na IBM, pelo trabalho da
Leilah em Informática e pelo estudo dos filhos na Escola Americana, que os tornou
bilíngues e os fez colegas de estrangeiros dos mais diversos países. O que não
impediu que todos eles se tornassem bastante cariocas, com sotaque ou não.
Leilah e eu éramos um casal ainda jovem,
adaptamo-nos ao Rio e aproveitamos bastante o que a vida na cidade nos
oferecia. Quando chegou, para cada um dos filhos, a etapa do curso superior, dois fizeram o curso universitário no Brasil e dois nos Estados Unidos e um destes não voltou.
Logo após se formar em Engenharia, ele conseguiu trabalho lá e mais tarde se casou
com uma colega de turma. O casal e os dois filhos americanos vêm ao Brasil com frequência,
mas estão firmemente radicados na Califórnia. Leilah e eu, até quando pudemos (hoje, a idade e
problemas de saúde tornam a viagem muito difícil), os visitávamos com
frequência. O que fazemos, agora, é aproveitar bem os ótimos recursos de comunicação disponíveis para estarmos
em estreito contacto com eles, e acompanhamos o desenvolvimento dos meninos.
Os outros três filhos moram no Rio; o terceiro e
esposa nos brindaram com o neto carioca, grande amigo nosso. Temos com eles uma convivência muito boa, a ponto de seus amigos se tornarem, também, amigos da Leilah e do Washington.
Voltando ao “O Projeto 3.7 e Nós”, comecei a
contar a história assim:
“Chicago,
muito prazer!
O
desembarque no aeroporto O’Hara foi algo incomum, para dizer pouco; foi quase
dramático. Um casal com três filhos e umas oito malas grandes chegando à hora
de almoço, após uma viagem São Paulo – Rio – Nova York (onde entramos no País e
mudamos de aeronave) e, finalmente, Chicago. Era maio de 1968, os aviões eram
Boeing 707, os mais modernos de então. Leilah, minha esposa, e eu estávamos na
casa dos trinta anos e os filhos tinham: Luiz, sete anos; Cássio, cinco; e
Francisco, dois e meio.
Como
procedimento normal, o casal deveria ter feito uma visita preliminar a Chicago,
a “look and see trip”, para planejar a mudança; entretanto, como minha
incorporação ao projeto se tornara urgente, não houve tempo para essa visita.
Assim, nossa chegada de mudança com três filhos pequenos, sem ter conhecimento
prévio da cidade, foi bem complicada.
A orientação
que recebi para irmos do aeroporto ao hotel era usar um ônibus especial que
transportava passageiros para os principais hotéis, entre os quais aquele que
havia sido reservado para nós. A solução nos pareceu boa, pois nossa família
iria precisar de, pelo menos, dois taxis, teríamos de viajar separados e a
despesa seria muito maior.
Achamos o
ônibus que nos levaria ao Hotel Sheraton da Michigan Avenue, em Chicago; a
bagagem foi carregada, acomodamo-nos e , sem grande demora, iniciamos a viagem
ao centro da cidade onde, por cerca de dois anos, eu iria trabalhar. Tivemos
então um primeiro contato com a Roosevelt Expressway, seu tráfego
impressionante, até que, ao nos aproximarmos do centro da cidade, vislumbramos
o perfil marcante de seus grandes edifícios e, a seguir, suas ruas e avenidas
que depois se tornaram tão familiares para nós. Chegamos ao hotel, situado no
trecho da avenida conhecido hoje como a Golden Mile, que concentra
estabelecimentos comerciais de alto nível, restaurantes e hotéis, e se
beneficia da proximidade do lago Michigan e do rio Chicago, com suas pontes
vistosas.
No
desembarque do ônibus, recebi uma bronca do motorista por causa da quantidade
de malas: “You should have taken a cab!”. Não foi uma observação muito
delicada, mas não tinha de lhe dar explicações; apenas, dei-lhe a gorjeta
convencional”
Chegamos a Chicago no dia 29 de maio de 1968, uma
quarta feira. É o cinquentenário deste início de aventura que estou comemorando
hoje.
Washington Luiz Bastos Conceição
E que deve ser mesmo muito comemorado, já que esses 50 anos definiram o rumo definitivo de suas vidas. O enredo de sua história teve início naquela tumultuada viagem com três filhos pequenos, a chegada a um país estranho, dispostos como só os jovens podem ser, para uma vida inteiramente diferente da vivida até então. Isso os preparou bem para os muitos desafios que a vida apresenta. Foi, como você comentou, um ano de muitos acontecimentos marcantes no mundo todo, mudando o rumo da História. A sua foi mais uma, entre tantas. Abraços. Isa
ResponderExcluirParabéns...uma aventura e tanto...lembro que as designações internacionais da IBM abriam um senhor caminho na vida profissional dos seus funcionários ...uma ótima experiência.
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