domingo, 19 de janeiro de 2025

Onde estamos? Aonde vamos?

Cara leitora ou prezado leitor:

Tenho de lhe contar! Não sei se é coisa ligada à idade avançada. Saiba o que me aconteceu:

Resolvi escrever uma nova crônica sobre erros comuns de Português que venho observando na comunicação escrita e falada, principalmente da mídia,  e que vêm me incomodando há já algum tempo.

Preparei o rascunho e fiz a revisão, mas, antes de publicá-la, resolvi reler as crônicas que publicara anteriormente no blog, sobre o uso de nosso idioma. Surpresa: vários dos casos que mencionei na nova crônica eu já havia mencionado naquela que publiquei em 2023! Como se dizia antigamente, “caí do cavalo”; desisti da publicação da nova crônica.

Contudo, em minhas elucubrações noturnas, pensei: se eu nem Leilah, que colabora na revisão, não nos lembrávamos daquela crônica, quantos de meus leitores, dentre aqueles que a leram, se lembrariam dos casos comentados? Só para estes a nova crônica traria repetições, o que poderia até servir de recapitulação.

Considerando que a nova publicação poderá ser de interesse para você, desisti de desistir. Ei-la:

“Onde estamos? Aonde vamos?”

Cara leitora ou prezado leitor:

Volto hoje a um assunto que me preocupa e que, talvez, também preocupe meus leitores: o uso correto de nosso idioma. Ao longo destes treze anos de blog, já foi  tema de crônicas, mas sinto que tenho de recapitular alguns casos. Desta vez, para agilizar a leitura, criei uma conversa em uma reunião minha com amigos; fictícia, portanto, mas tão realista quanto possível.


Comecei:

Washington ― Amigos, obrigado por toparem fazer esta reunião comigo. Fico satisfeito por vocês se interessarem pela correção no uso do Português. Nossa conversa vai ser a base para a  próxima crônica que vou escrever e publicar no blog.

Proponho que comentemos erros de linguagem, escrita e falada, que temos observado na mídia e na comunicação direta com pessoas. Para não estendermos demais a conversa, não vamos tratar de erros de ortografia. Vamos fazer uma espécie de revisão, cada um de nós trazendo suas observações ou dúvidas. De acordo?

Os participantes passaram a se manifestar:

Participante1 ― Acho que falo por todos: estamos interessados e será um prazer participar da reunião.

W ― O título da crônica será: “Onde estamos? Aonde vamos?”

P2 ― Por que esse título?

W ― Porque o uso equivocado de “aonde” em vez de “onde”, até por profissionais do jornalismo falado e escrito, vem me incomodando já há algum tempo. E é uma forma de chamar a atenção do leitor em potencial.

Podemos começar com esse caso. Muita gente está sendo levada a cometer esse erro, dizendo “Aonde estamos?”, em vez de “Onde estamos”. O lugar “em que” alguém ou algo se encontra é indicado por “onde”. Aonde indica movimento (a+onde). Exemplo: “Aonde vamos?”. Suspeito que o uso indevido de “aonde” seja causado por uma intenção de dar ênfase.

P3 ― Eu não estava prestando muita atenção na diferença. Vou me cuidar...

P2 ― Eu observo que muitas pessoas, mesmo aquelas com formação universitária, falam – talvez escrevam - “assisti esse filme” em vez de “assisti a esse filme”.

P1 ― Também noto isso. Assistir, como verbo transitivo, significa “ajudar”, daí a função do “assistente” de um gerente, por exemplo.

W ― Essas observações levantam a questão da chamada regência dos verbos. Um erro comum é “preferir alguma coisa do que a outra”, que fica gritante quando um colunista qualificado comete. O correto é “preferir alguma coisa a outra”.

P2 ― A gente também chega “a algum lugar” e não “em algum lugar”; um rapaz namora “uma garota” e não “com uma garota”...

P3 ― E implicar, no sentido de “ter consequência”? É muito comum ouvir  ou ler “Casamento implica em maior responsabilidade” quando o correto é “Casamento implica maior responsabilidade”.

W ― Quanto ao verbo visar: no sentido de pretender, o correto é usar “visar ao sucesso do projeto” e não “visar o sucesso...”. Confesso que, em alguns casos, quando a ideia é buscar alguma coisa, não uso a preposição (faço analogia com o uso de uma luneta).

W ― Os verbos irregulares também pegam muita gente, acho que o campeão é o verbo haver, que também é um verbo auxiliar. No sentido de existir, o sujeito é indeterminado e é conjugado na terceira pessoa do singular. “Haverá aumentos de preços”. e não “Haverão aumentos de preços.”. “Os homens honrados haverão de lutar” está correto porque o verbo haver aqui é auxiliar.

P1 ― Lembrei-me do “Fazem cinco anos que estive lá.” É outro caso de sujeito indeterminado. O correto é “Faz três anos...”. A expressão equivalente é “Há três anos”, cuidando para não escrever “Há três anos atrás”, porque o atrás é desnecessário.

P2 ― Lembrei-me de minhas aulas de Português! É o chamado pleonasmo.

P3 ― É. E na hora de escrever, pode surgir a dúvida: “É ‘há’ ou ‘a’ três anos que fizemos aquele passeio?”;  é “há”; a preposição “a” indica futuro: “Daqui a três anos”.

P2 ― Não vamos falar da crase? Não é apenas uma questão de ortografia.

P1 ― Observo que é algo que muita gente com estudo superior ainda tem dúvida. Em primeiro lugar, crase não é o acento grave; este indica a crase, que é, simplesmente a junção (fusão?) da preposição “a” com o artigo “a” (ou o plural “as”) ou com o “a” inicial de “aquele”, “aquela” e “aquilo”. Exemplo nada modesto: “Irei à casa do Washington e darei brilho àquela reunião”.

P2 ― Quando alguém me pergunta se em determinada sentença há a crase ou não, dou a dica: substitua a palavra feminina por masculina - se você tiver de falar ou escrever “ao”, então há crase. No exemplo anterior, substituindo “casa” por “apartamento”: “Irei ‘ao’ apartamento...”. Sobre “aquele”, etc. não fui consultado.

P3 ― Há também a colocação dos pronomes oblíquos na sentença: antes do verbo, depois do verbo e no meio do verbo.

P1 ― Ah, Ah! São a próclise, ênclise e mesóclise... De vez em quando noto colocação equivocada em redação: “Quando levantei-me”, em vez de “Quando me levantei”, por exemplo.

W ―  Bem, acho que chegamos a tratar dos erros mais comuns, que chamam nossa atenção, o que era nosso objetivo na reunião. Livros de gramática mencionam muito mais casos, como aqueles destinados a preparar pessoas para concursos. Antes de encerrarmos, quero fazer mais dois comentários:

Há erros elementares que, comumente, cometemos ao falar, por hábito generalizado – é o nosso Português informal. Exemplos: a concordância pronominal: “Você vai levar teu casaco?”; o uso equivocado de pronomes do caso reto: “Ela encontrou ele no metrô”; o uso do “que” desnecessário: “O que que você viu lá?”. O uso de “ter” em vez de haver: “Tem arroz no freezer?”... Temos de evitá-los ao escrever.

E há, também, casos de modismo, nem sempre erros, mas que, disseminados, se tornam mal-empregados. Pode ser implicância minha, mas “desde sempre” é equivocado, porque “desde” indica um ponto inicial no tempo (“Desde onze horas estou esperando você.”) e “sempre” indica continuidade. E seu uso está generalizado – a expressão é original, tem seu charme. É semelhante a “a nível de” que foi intensamente utilizada há alguns anos. O uso errado de “aonde”, já comentado, também virou moda. “Empatia” tem sido usada como sinônimo de “simpatia”, mas não tem o mesmo significado. “Resistente” está sendo substituído, com muita frequência, por “resiliente”, o que não está errado, mas não deixa de ser modismo. Este caso me faz lembrar de minha mãe, quando, já nonagenária, passou a usar “diferenciado” em vez de “diferente”...

P3 ― Pela expressão dos amigos, parece que todos concordamos em ficar por aqui.

P2 – Eu estou curioso: será que os leitores vão comentar nossas observações?

P1 ― Acho que eles vão aumentar a lista de casos.

W ― Vamos aguardar. Muito obrigado a vocês pela participação.


Ao caro leitor ou prezada leitora: lembro a você que não sou professor de Português, sou apenas um cuidadoso usuário do idioma.

Washington Luiz Bastos Conceição


Nota:

Minhas crônicas sobre o tema, publicadas anteriormente, foram:

Da taquigrafia eletrônica e da escrita formal

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2015/01/da-taquigrafia-eletronica-e-da-escrita.html 

O que é que há?

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2016/12/o-que-que-ha.html

A importância de seu idioma

https://washingtonconceicao.blogspot.com/2023/08/a-importancia-de-seu-idioma.html

 


4 comentários:

  1. Sempre bom trazer conhecimento e nos lembrar como nosso idioma é rico ! Vamos usá-lo corretamente!

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  2. Muito bom! Ainda existe o problema de não colocarem o "r" no final dos verbos no infinitivo. Não pronunciam e não escrevem.

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