Prezada leitora, ou caro leitor:
Por favor, responda mentalmente às perguntas
que faço abaixo:
- Você percebe que, em igualdade de outras aptidões,
quem escreve ou fala melhor tem melhores posições no mercado de trabalho?
- No seu trabalho, você pensa que usar o idioma
corretamente ajuda na obtenção de resultados ou na qualificação de seu
desempenho?
- Você se preocupa em falar corretamente, ou
seja, segundo as regras gramaticais estabelecidas?
- Você se preocupa em escrever corretamente, ou
seja, segundo as regras gramaticais estabelecidas?
- Você rejeita a incorporação desnecessária de
palavras de idiomas estrangeiros ao seu idioma?
- Você gostaria de que seus filhos e netos falassem e escrevessem bem em seu idioma?
Se respondeu positivamente a uma dessas
perguntas e se usar o idioma Português, provavelmente se interessará em ler esta
crônica.
Estimulado, principalmente por meu pai, a falar e escrever corretamente em Português (minha língua pátria) desde criança, venho tendo esse cuidado ao longo da vida. Transmiti essa preocupação a meus filhos.
Neste blog, tratei do assunto em algumas crônicas,
mas permaneço desencantado com o descaso, incompetência e desrespeito com que
nosso idioma vem sendo tratado, especialmente por profissionais e políticos,
seja por falta de educação, ou por necessidade de desconstrução dos costumes ou
de apresentar e forçar novidades desnecessárias, inconvenientes, que não
constituem evolução linguística e não melhoram a comunicação.
Então, penso: “Será que estou dando importância
exagerada ao assunto?”. Exagerada, no caso, em relação à importância que as
pessoas, jovens e maduras, profissionais da comunicação ou não, dão ao uso
correto do idioma.
Resolvi, portanto, discutir essa minha preocupação
com alguns de meus filhos que, já adultos maduros com estudo e grande
experiência de trabalho, escrevem bem textos de apresentações, relatórios,
documentos, mas, também, usam a linguagem abreviada das mensagens digitais e
expressões coloquiais. Eles demonstram se importar com o assunto.
Outro dia, tive o seguinte diálogo com Jurema, minha filha:
― Pai, não aguento ouvir as pessoas usando “aonde”
e “haverão” erradamente.
Por exemplo: “Aonde você está?” em lugar de “Onde você está?” e “Haverão
distúrbios” em vez de “Haverá distúrbios”. E, muitas, são pessoas de curso
superior, como jornalistas e advogados por exemplo...
Respondi:
― Pois é, minha filha. Usar “haverão” no sentido
de “existirão” é um erro antigo, pois o verbo haver, no sentido de existir, é impessoal,
não tem sujeito determinado e é conjugado na terceira pessoa do singular. A
palavra “haverão” é usada quando “haver” tem outros significados ou é verbo
auxiliar.
O uso equivocado de “aonde”, intensificado mais
recentemente, de certa forma, virou moda. E é tão fácil observar que “aonde” é
“a” mais “onde” e indica movimento. “Onde” indica um lugar (parado).
― Também me incomodam erros de concordância de gênero
e número e algumas expressões como “Você quer que eu pego?”, por exemplo.
― Continuam cometendo, além dos erros clássicos de
concordância, aqueles de regência de verbos, como: “Prefiro caminhar do que
correr.” em vez de “Prefiro caminhar a correr.”; “Você vai assistir o
jogo hoje?” em vez de “Você vai assistir ao jogo hoje?”.
― Bem, filha, há, claro, muitos outros exemplos de
incorreções, especialmente se considerarmos, também, erros de ortografia; esta
nossa conversa iria muito longe. É importante lembrar que estamos tratando de
fala e escrita formais, de trabalho, e não do Português coloquial que usamos
todos nós; e que, também, mandamos mensagens informais e abreviadas.
― Minhas mensagens no WhatsApp têm de ser rápidas
e eu uso muito as abreviações convencionais; mas me faço entender.
― Tenho de comentar que não me considero professor
ou “autoridade” no assunto. Considero-me um bom aluno que procura ajudar com
seu conhecimento. Como nosso idioma é muito complexo, estamos sujeitos a alguns
deslizes. Por exemplo, até outro dia eu falava “octagenário” para me referir a
um homem na década dos 80 anos de idade. Na escrita, o corretor acusou erro – e
aprendi que o correto é “octogenário”. E veja bem como somos induzidos a erro:
o indivíduo na década de sessenta é “sexagenário”, na de setenta é
“septuagenário” (ou “setuagenário”) e o de noventa é “nonagenário”. É fogo, não
é?
― Sim, pai, bem complicado...
― Penso que as pessoas que precisam falar e ou escrever
corretamente podem usar a ajuda de um livro de gramática. Estes livros,
entretanto, são organizados em tópicos para estudo, de modo que consultas
específicas são trabalhosas e, muitas vezes, o tempo é curto. Neste caso, a
versão digital dos livros (e-book) é bastante conveniente, porque o programa
Kindle oferece pesquisa automática de palavras. Testei e gostei.
― Pai, seria interessante o senhor escrever uma
crônica sobre o assunto.
― Fico satisfeito por saber que você se preocupa
com o uso de nosso idioma, o que acontece também com seus irmãos; eles, de vez
em quando, me consultam para resolver alguma dúvida. Sim, minha filha, vou
escrever nova crônica sobre o tema – e vai ser baseada em nosso diálogo.
Washington Luiz Bastos Conceição
Complementos:
Excerto da crônica “Da Taquigrafia Eletrônica”, publicada em janeiro de 2015.
...
Nada tenho contra a escrita abreviada de e-mails e
mensagens, desde que o texto cumpra seu objetivo de comunicar – mas ela não
deve ser considerada substituta da redação completa e correta em nosso idioma,
não só quanto à ortografia como – e principalmente – quanto à concordância e ao
uso apropriado das palavras.
Uma coisa é uma comunicação escrita rápida,
informal, outra muito diferente é o texto de uma proposta de negócios, um
relatório técnico, uma crônica, uma notícia de jornal, um comentário político,
enfim, uma comunicação formal. Este tipo de comunicação requer uma redação que se
enquadre nas regras do idioma. Por esta razão, todo profissional, mesmo que não
tenha grau universitário, precisa saber escrever corretamente.
Em minha longa vida de trabalho, observei que os
profissionais que se expressavam corretamente por escrito levavam vantagem
sobre colegas que, embora no mesmo nível técnico, não tinham essa habilidade.
As atividades normais do trabalho, até as científicas, requerem competência
redacional para a elaboração de apresentações, relatórios, propostas comerciais
e planos empresariais.
Em suma, a comunicação eficaz, hoje em dia, requer
o uso de mensagens eletrônicas informais, com abreviações ou não, por sua
agilidade, rapidez, e por poder ser feita mediante dispositivos portáteis. Por
outro lado, quando formal, a comunicação eficaz requer o uso de textos técnicos
ou de negócios redigidos corretamente.
Dentre os profissionais igualmente competentes no
que fazem, aqueles que têm boa redação valem mais.
Excerto da crônica “O que que há?”, publicada em dezembro de 2016
Nestes tempos em que a comunicação, escrita e
falada, vem se tornando cada vez mais intensa, a importância dos idiomas é cada
vez maior. No Brasil, como estamos usando nosso idioma?
De uma forma geral, para escrever, usamos o
Português procurando seguir as regras gramaticais e ortográficas.
Para falar usamos o Português coloquial, ou seja,
procuramos falar o mais corretamente possível, mas, por hábito, empregamos
expressões que, embora incorretas, são de uso geral e corrente. Por exemplo, no
dia a dia, empregamos: o verbo “ter” em vez de “haver” (“Tem louça na
máquina?); não respeitamos concordâncias (“Você veio no teu carro?”); e muitos
ainda cometem erros daqueles bem conhecidos (“haverão” no sentido de existirão,
“fui na casa dele”, e outros). Usamos esse mesmo Português coloquial ao
trocarmos mensagens por telefone celular, “tablet”, ou computador, recorrendo
intensamente a abreviações.
Há, ainda, aquelas pessoas que não tiveram
oportunidade de estudar, muitas analfabetas ou quase, que erram muito ao falar,
ofendendo grosseiramente a gramática elementar e, faltando-lhes vocabulário,
recorrem à gíria (sempre renovada) e ao jargão de suas atividades específicas.
Meus parentes e amigos, bem como os meus outros
leitores mais antigos, já sabem de minha preocupação com o Português. Hoje,
volto com mais considerações sobre o assunto porque, mesmo aturdido pelo
horrível noticiário da televisão nestes dias tão agitados, não consigo deixar
de reparar em algumas impropriedades na linguagem utilizada repetidamente pelos
repórteres e comentaristas, jornalistas competentes em seu trabalho, que se
expressam muito bem e têm bom vocabulário. Penso, então, que estamos em crise
também no uso do Português.
...
Reconheço, aqui, que estou fazendo o papel do
brasileiro escolarizado, com a melhor das intenções, altamente preocupado com
os comunicadores que falam em público, especialmente na televisão, que poderiam
cuidar de passar um “sermo urbanus” de melhor qualidade ao espectador. Na
televisão, já corrigiram o “Boa noite a todos que estão nos assistindo!”,
passando simplesmente a dizer “Boa noite a todos!”, mas, por exemplo, poderiam
passar a usar: “O que está acontecendo?” em vez de “O que é que está
acontecendo?”; “onde está” em vez de “aonde está”; “quando se tornou” em vez de
“quando tornou-se”; “prefiro este àquele” em vez de “prefiro este do que
aquele”.
Destaco aqui a televisão porque, além de realizar
papel importantíssimo na unificação do uso do idioma em todo o País, poderá
contribuir mais para o aprimoramento desse uso, independentemente de programas
educacionais específicos.
O caro leitor ou a prezada leitora poderá reclamar: “Washington, não dá para falar tudo certinho o tempo todo, ficaria até chato!” Concordo, devemos nos esforçar para falar melhor usando o bom senso, ou seja, comunicando-nos da forma mais apropriada a cada ambiente e situação. Por exemplo, “O que é que há?” é perfeitamente adequado a uma comunicação informal. D. Ivone Lara usou essa expressão muito bem e podemos cantar com ela: “Foram me chamar, eu estou aqui, o que é que há...”.
Ou seja, tudo tem seu lugar e sua hora.
Nota:
Para o leitor ou leitora que se interesse em ler estas duas crônicas por completo, informo os respectivos links:
http://washingtonconceicao.blogspot.com/2015/01/da-taquigrafia-eletronica-e-da-escrita.html
e
http://washingtonconceicao.blogspot.com/2016/12/o-que-que-ha.html
Sempre gostei de Português e, apesar de ser uma língua com muitas regras, escrever e falar corretamente não precisa de rebuscamento. Aliás, acredito que quanto mais simples melhor 😊. Até hoje, quando me vem a dúvida, consulto dicionário e regra e aprendo mais um pouquinho.
ResponderExcluirDo amigo Pimentel:
ResponderExcluirGostei muito das suas crônicas sobre o Português correto. Certa vez conversava com um amigo escritor e comentei que sempre pensei em escrever um livro mas desistia porque sou muito preocupado com a língua. Escrevo uma página e a revejo ene vezes. Reflexo certamente das minhas aulas de português no Colégio Marista São José onde o professor tirava ponto do trabalho até por uma vírgula colocada no lugar errado! Ainda hoje tenho o costume de rever minhas postagens no WhatsApp e no facebook antes de, ou logo após, enviá-las. Não sai sempre perfeito, mas eu tento. O WhatsApp introduziu recentemente um recurso de revisar a mensagem até mesmp depois de enviada! Já o facebook também permite editar um texto mesmo depois de postado, sem limite de tempo.
De meu neto Bruno, 19 anos:
ResponderExcluirVovó, gostei da crônica mas minha opinião é que a língua é viva.
Concordo que vários erros que o senhor mencionou não devem ser feitos em um ambiente de trabalho ou discussão profissional, mas eu acredito que a partir do momento que um erro é cometido múltiplas vezes por muitas pessoas, ele acaba sendo incorporado na língua e eu acho isso normal porque quem faz a língua é a comunidade. A Academia Brasileira de Letras abriu várias exceções por conta disso e, num mundo globalizado, fica tambem dificil deixar uma lingua intocada.
Sim, a língua é viva e o uso vai consagrar expressões. Entendo que a comunidade que você mencionou é, pelo menos, o país. E, realmente, a Academia Brasileira de Letras deverá cuidar do processo. Obrigado pela participação.
ExcluirErrata: ...vários erros que o vovô mencionou...
ResponderExcluirDa amiga Maria Lúcia:
ResponderExcluirMuito interessante e super bem colocada!!!
Da prima Thais:
ResponderExcluirMinha família também sempre valorizou muito o rigor na correção dos textos. Infelizmente a imprensa escrita atual apresenta erros em abundância e parece ter dispensado os revisores.
Do primo Ruy:
ResponderExcluirOi, li e gostei. Concordo inteiramente com os conceitos emitidos. O descaso é geral. Para ilustrar, a constatação de que jornalistas, professores, intelectuais e até membros de academias utilizam um 'duplo sujeito' como em "O Brasil ele está...", "Até amanhã a situação ela melhora", e pouco se importam em aderir à descuidada e errônea formação do plural, tão em voga: "Está acontecendo muitas faltas", "...transferências internacional", "foi feito as queixas", "com isso ficava prontos os barcos". (Frases autênticas,escritas ou pronunciadas nos meios de comunicação). Abraço.